19 maio 2010

Armadilhas do paradigma?

istockphoto_11542963-businessman-holding-crystal-ball[1] Vivemos um paradigma na saúde (tanto pública como suplementar) já há muito estabelecido: nossa medicina é assistencial curativa. Ou seja: tratamos de pessoas doentes, visando curá-las.
Nobre objetivo, mas é “matar a vaca para matar o carrapato”.
Num país em que saúde não havia, como testemunha Mário de Andrade, na voz de Macunaíma (“Muita saúva e pouca saúde, os males do Brasil são”), era preciso iniciar por algum lugar. Tratar a pessoa adoecida era a solução mais adequada, pois a saúde era só urgências e emergências.
Premidos por contratos abusivos e preços escorchantes, consumidores se fizeram ouvir pela Lei 9656. Que estabeleceu as regra mínimas do setor, e foi um enorme avanço em termos de assistência médica. Por outro lado, o paradigma ainda se manteve na medicina curativa.
Debelada a crise da situação caótica (não que o caos tenha sido ele próprio debelado: mas diminuiu, temos de reconhecer), o mercado se defronta com o preço do paradigma: a assistência médica curativa custa caro, muito caro, e não há sistema, por melhor que seja, que conviva eterna e exclusivamente com esse modelo.
Assim, quando tratamos dos problemas atuais da saúde suplementar, ainda caímos nesse paradigma, pois dele ainda não nos livramos. O problema na demora em consultas e internações (procedimentos em geral) é somente um sintoma dessa armadilha paradigmática. É sconsequência, não causa.
A saúde suplementar no Brasil caminha, ora trôpega, ora célere, em direção à medicina preventiva em lugar da curativa. Manter a saúde do indivíduo já está se transformando no novo paradigma, sendo a medicina curativa, neste cenário, coadjuvante daquilo que representa a vicissitude da vida. Ora seremos acometidos por doenças, isso é um fato. Mas podemos evitar a grande maioria delas, este é outro (grande) fato.
Para chegar nesse novo ponto, temos de manter controladas nossos hábitos e riscos. A medicina curativa, devidamente direcionada, pode ser mola propulsora da conscientização e educação individual e coletiva. Até que chegará o dia em que o normal será a consulta de check-up, de orientação, em vez daquela orientada a queixas sobre saúde, quando a doença já se manifestou.
Três fatores se destacam na importância dessa transformação: educação, controle e adesão.
A educação pressupõe que haja maciça oferta de informação aos indivíduos, que poderão utilizá-las em benefício próprio.
O controle,tecnicamente definido e estabelecido, é o conjunto de medidas que precisa adotar cada indivíduo para se certificar de que sua saúde está em dia, com os riscos controlados, ou para que haja detecção precoce de doenças.
E a adesão é a iniciativa individual de receber a informação oferecida e transformá-la em hábito saudável, concretizando a ação preventiva.
Os players dessa transformação já são sobejamente conhecidos, mas é preciso destacar dois: o indivíduo, sem o qual o problema (e a solução) não se concretiza. E a Agência Nacional de Saúde (ANS), hoje a agência mais ativa e efetiva do país, em que pese todas as reclamações contra si (é uma das atividades sociais mais complexas, mas a ANS tem se desincumbido dela de forma mais que satisfatória ).
Assim, se tratamos dos problemas ainda pertencentes ao paradigma já ultrapassado da saúde, é porque motivo há: ultrapassado ou não, ele ainda é a realidade predominante. Infelizmente.

18 maio 2010

“Suficiência de rede” soluciona a espera nos planos de saúde?

 521961_hospital_bed[1] No Blog de Maria Inês Dolci de ontem, a notícia de que há, na ANS, estudo em andamento para emitir normativa normatizando a “quantidade de profissionais disponibilizados na carteira dos planos de saúde”, confirma a informação de que a agência está se dedicando ao problema.

Mas regulamentar a quantidade de profissionais à disposição não resolve o problema, apesar de ser um início. O que poderá desenhar um quadro real do problema é saber quantas consultas, no caso de consultórios, esses profissionais oferecem. O raciocínio é simples: não adianta ter muitos médicos na carteira se eles disponibilizam uma consulta por semana ao plano. É preciso saber exatamente isso: qual é a demanda que eles se propõem a atender.

No caso das cooperativas médicas, que têm nos médicos seu foco de atuação, o problema de espera nas consultas também existe, o que permite supor que também ali há algo que desequilibra demanda e oferta. Suspeita-se que seja a preferência às consultas particulares, de valor mais alto que as consultas bancadas por planos de saúde. Há, de fato, relatos de pessoas que, ao ligarem para marcar consulta, dizem ser particular, apresentando sua credencial do plano somente no ato do atendimento. Procedimento esse que, lamentável registrar, abrevia o tempo de espera.

Assim, quantidade de profissionais e estabelecimentos não garantem oferta. Quantidade de procedimentos, sim. Ao hospital que diz ter leitos de internação, por exemplo, é preciso perguntar: quantos desses leitos estará disponíveis para a operadora (e seus beneficiários)? Ao médico, cabe perguntar: quantas consultas serão feitas por mês aos beneficiários da operadora?

Registro, novamente, a dificuldade na implementação da medida: há primeiras consultas, há consultas de seguimento e há as consultas com procedimentos. Há internações simples, há as complexas. Enfim, a natureza do atendimento pode demandar alterações nessa lógica, mas nada que um pouco de dedicação dos normatizadores não resolva.

Ainda com essa providência, é preciso insistir: é necessário que tenhamos indicadores que mostrem qual é o tempo de demora entre a data da solicitação (da consulta, da internação ou do exame) e sua efetiva realização. Porque não importa que medida seja tomada para abreviar o tempo, se não medirmos esse tempo. Há o problema, há a solução, e há o indicador a ser acompanhado. E, no caso, o indicador é o tempo.

17 maio 2010

O atendimento da Saúde Suplementar

579198_clock[1] A necessidade que o mercado vem apresentando de que seja monitorado o tempo entre a solicitação da consulta e sua realização enfrenta alguns entraves operacionais para ser ativado. E não são pequenas.

Hoje, a ANS analisa somente dados financeiros e pós atendimento. E é por essas medidas, basicamente, que age sobre operadoras que representem riscos ao consumidor/beneficiário. Há muito a mídia especializada e órgãos de defesa do consumidor têm apontado a dificuldade na marcação de consultas ou mesmo na obtenção de leitos para internação como grandes problemas do mercado.

Para resolver essa questão, as operadoras teriam que controlar dois fatores que hoje são raros: a solicitação do procedimento (principalmente a consulta) e sua realização.

Nos casos de internações, por envolverem maiores custos, já há meio caminho andado, pois as operadoras emitem guias para que o procedimento seja realizado em regime de internação. Bastaria, portanto, criar mecanismo de controle para que se controlasse também a data da solicitação dessa guia de internação, o que daria, em conjunto com a data do efetivo atendimento, a real medida do tempo de espera.

As consultas, entretanto, não têm a mesma preocupação por parte das operadoras, que normalmente as controlam pelos prazos intervalares entre elas. Seria necessária emissão de guia/autorização, na data da solicitação, em nome de determinado profissional, e acompanhar a data da efetiva realização. Como consultas são procedimentos mais baratos que internações (a despeito da quantidade de exames que geram), as operadoras estão na zona de conforto com relação a elas. Os consumidores, não.

Quando o consumidor procura a rede para marcar sua consulta, a operadora não tem participação alguma. E não tem como saber se o médico “prospectado” tem data para sete ou cem dias. E impede a análise do tempo de espera dessa consulta. Resultados indesejados dessa falta de visibilidade e controle são a alta procura às consultas e urgência/emergência e a automedicação.

Tem aumentado significativamente, nos últimos anos, a falta de disponibilidade imediata de consultas, exceto em pronto-atendimento, que, a seu turno, tem encontrado filas cada vez maiores. O problema seria de oferta? Seria a falta de vontade do médico em se credencias junto a operadoras, por causa dos valores pagos? Seria a insistência do beneficiário em se tratar com profissionais conhecidos e de confiança (medida recomendada pelos especialistas)?

A adoção de controles, na operadora, com prestação de informações à ANS, poderia mostrar a real dimensão do problema. E poderia, na medida em que esses números ficassem conhecidos, ajudar a estabelecer indicadores para resolver os problemas, agregando-os aos do IDSS, por exemplo. E, mais: poderia dar a medida comparativa entre demanda e oferta de serviços na saúde suplementar, incentivando empreendedores a agir nesse mercado.

A concorrência ajudaria no equilíbrio entre oferta e demanda? Acredito que sim.

16 maio 2010

Portabilidade?

istockphoto_6776504-waterdrop-on-white-background[1] A estimativa de que (somente) mil pessoas tenham mudado de planos de saúde em razão da portabilidade de planos de saúde mostra duas facetas da medida: a desinformação e a inadequação das regras, sendo esta mais preponderante.

A portabilidade nos planos de saúde veio na esteira da portabilidade das linhas telefônicas, que fizeram um grande sucesso, a despeito dos problemas de implantação. Mas planos de saude são muito mais complexos que linhas telefônicas, e a portabilidade, em si, não resolve nenhum problema que a concorrência já não tenha enfrentado.

Por exemplo, muitas operadoras já ofereciam dispensa de carência a usuários de outros planos na troca de operadoras. O grande entrave dessa negociação sempre foi e sempre será, como comprova a portabilidade, o preço inicial da mensalidade. Ora, com essa dificuldade não foi sanada pela portabilidade. Ao contrário, ela é um dos motivos de sua ineficácia.

Convenhamos: há coisas mais urgentes para serem feitas na saúde suplementar.

13 maio 2010

Informatização na Saúde

A maturidade e a condição financeira das empresas de saúde, sejam prestadores de serviços médico-hospitalares, sejam operadoras de planos de saúde (OPS), normalmente determina seu grau de informatização. Alta maturidade e boa condição financeira determinam alto grau de informatização, posto que permite aos administradores identificarem suas necessidades de automação e controle e invistam na solução dessa necessidade.

Essa maturidade, entretanto, é normalmente alcançada em etapas. Como na Pirâmide das Necessidades de Maslow, há os níveis de necessidade mais básicos, indo aos mais estratégicos, e a instituição normalmente enxerga somente o próximo passo da sua própria necessidade. Isso impede o correto planejamento da informatização plena, agravado pelo fato de que “informatização plena” é uma falácia.

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As empresas normalmente iniciam a informatização pelos sistemas de back-office, por motivos óbvios. Daí, inicia-se o processo de automação de processos repetitivos (ou com maior demanda), implementam-se relatórios gerenciais, percebem-se as necessidades de controle informatizado, surge a necessidade de criar e gerenciar regras de negócio. Neste ponto, ou pouco antes, a integração com outros sistemas, próprios ou de fornecedores, clientes e parceiros torna-se preocupação (ou são determinados pela lei, como no caso da TISS),e, finalmente, apuram-se os dados estratégicos pelo B.I. (muitas empresas têm sistemas de B.I. sem ter informações estratégicas).

A partir da presença desses fatores de informatização é que as empresas começam a se destacar. A presença da informação, estruturada e identificada, permite que outros sistemas de inteligência artificial sejam adotados, sempre em benefício do negócio e seus usuários. A utilização de smartphones na gestão e operação, por exemplo, ainda não é uma necessidade, é uma oportunidade. Aqueles que querem agilidade e rapidez e contam com sistemas e usuários com certo grau de maturidade podem se valer de recursos de smartphones para estabelecer diferencial de negócio que os coloquem à frente da concorrência e respondam proativamente às suas próprias necessidades.

A utilização de teleconferências, por exemplo, também não é uma necessidade. É a resposta a uma necessidade, provida pela informática. Portanto, embora não seja uma informatização na acepção usual da palavra, é a aplicação de recursos de informática na satisfação de necessidades operacionais e logísticas.

Administradores atentos para custos, recursos e prazos devem considerar a utilização de ferramentas de informática e sistemas de informação como o grande ferramental para solução ou instrumentalização de suas problemáticas. E, ao conjugar sua percepção de necessidades com seu poder de investimento, deve sempre preparar o ambiente para que novas soluções sejam implementadas. A solução mais barata ou mais óbvia nem sempre possibilita essas evoluções, como no caso de aquisição de sistemas de ERP com tecnologias anacrônicas.

11 maio 2010

Atendimento na saúde suplementar: quando teremos indicadores?

istockphoto_1999765-people-in-a-queue[1] Proliferam na internet e na mídia convencional relatos de demoras no atendimento de beneficiários de planos de saúde. E não se restringem a consultas, atingindo também outros procedimentos e internações.

A demora tem início no atendimento na operadora de planos, e tem sequência no prestador de serviços, normalmente um hospital ou clínica. Consultas disponíveis somente após mais de 45 dias de espera, internações que têm demora na aprovação ou, aprovadas, não têm vagas em hospitais. É a contaminação que sofre a saúde suplementar daquela do qual fogem seus beneficiários: a saúde pública.

Sem que tenha havido crescimento relevante (mais vegetativo) na população assistida, o atendimento se encontra em fase crítica. Mas esta afirmação é temerária, pois essas reclamações são os únicos dados que se tem para inferir a baixa oferta de serviços.

Nos Cadernos de Informação, seria necessário que se expusessem os números das redes de atendimento. Por plano, por operadora, por beneficiário, etc, mas é necessário que conheçamos os indicadores da capacidade de atendimento dessa rede prestadora.

  • Quantos são os hospitais que oferecem seus serviços às operadoras?
  • Quantos são os leitos disponíveis?
  • De quais especialidades?
  • Quantos são os médicos?
  • De quais especialidades?
  • Qual é a taxa de utilização desses serviços?
  • Qual é sua distribuição geográfica?

São muitas as indagações, e também são muitos os entraves operacionais para atender à essa necessidade de informação. Um hospital, por exemplo, presta serviços a várias operadoras. Como, então, calcular o número de leitos por operadora? Idem para médicos. Apesar das dificuldades, a necessidade é premente, e sua satisfação pode, inclusive, quantificar a necessidade de novos prestadores de serviços (e seus ninhos), e mesmo a necessidade de formação de categorias profissionais (médicos, enfermeiros, etc).

A ANS conta com sistemas que totalizam dados econômicos, permitindo acompanhar a situação financeira das operadoras, para decidir rapidamente em casos de insolvência (perigo para o beneficiário, portanto). Tem dados de beneficiários, que lhes permite… cruzar informações com atendimentos do SUS. Tem poucas informações sobre as redes (por causa de características das normas). Para o beneficiário, entretanto, é muito mais interessante que a ANS se ocupe da rede prestadora do que ao ressarcimento ao SUS, que é um processo sempre em questionamento.

Inquestionável é que há algo errado na capacidade de atendimento da rede, e a maioria das operadoras está sentindo esse problema. Os aumentos das mensalidades de planos de saúde estão controlados, a saúde financeira das operadoras está sob constante vigilância, a informatização está em forte processo de assimilação, mas a capacidade de atendimento está se deteriorando. É preciso reagir a isto, ou a saúde suplementar no Brasil, em curto espaço de tempo, ter-se-á amalgamado com a saúde públicas, mas nas sua piores deficiências.

Qual é, e qual deveria ser a capacidade de atendimento das operadoras de planos de saúde?

04 maio 2010

Novo Presidente da ANS e o mercado.

Maurício Ceschin é o novo presidente da ANS, e já despacha como tal.

Ao contrário dos que aderem às teorias da conspiração, acho muito positivo que a agência tenha alguém que conhece profundamente o mercado. Apesar de ser a maia atuante, a agência lida com um dos maiores problemas nacionais, o da saúde, e precisará mesmo, cada vez mais, refinar e apurar mecanismos de controle e regulação.

Em ano eleitoral, a grande movimentação até agora tem sido a TUSS – Terminologia Unificada em Saúde Suplementar, que é, sem dúvida, um passo importantíssimo em direção à padronização necessária ao setor. Com a posse de CESCHIN, espera-se que alguns assuntos ganhem celeridade, como a grave questão da falta de capacidade de atendimento por parte da rede credenciada das operadoras.

O mercado já tem players que trabalham preocupados com esses indicadores, e sua permeabilidade com a ANS é de suma importância para a resolução de problemas estruturais ainda existente. Assim, que Ceschin possa desenvolver seu trabalho é o mínimo que podemos desejar.