12 setembro 2013

Unimed Paulistana em regime fiscal

O Diário Oficial da União de 10/09/2013 publicou resolução da ANS determinando a instauração de Regime Fiscal na Unimed Paulistana. Com 810.791 beneficiários em julho/2013 e IDSS de 0.5956 (dados na ANS), a operadora já tinha experimentado um longo período de intervenção.

Situada na maior cidade do país, o atendimento da população em trânsito naquela cidade incumbe à ela, no que é chamado de intercâmbio, estimando-se que chegue a 1.500.000 pessoas as cobertas pela atuação da operadora.

Como o regime de direção fiscal pode se entender, como no caso anterior, por muitos meses, a angústia retorna aos beneficiários de planos de saúde da Unimed Paulistana: qual será seu destino?

O mundo Unimed está preparado para absorver o contingente caso necessário. A Central Nacional Unimed e a Seguros Unimed, ambas com sede em São Paulo, além da FESP, as federação estadual das UNIMED em São Paulo, têm amplas condições de assumir o atendimento sem maiores problemas, exceto aqueles causados pela expressiva quantidade de que se trata.

(Interessante notar que o índice de reclamações da Unimed Paulista, sempre segundo o site da ANS, é de 5,57 (acumulado no ano). O da Unimed São Luís era de 2,00. Esta, entretanto, estava com a nota zerada no IDSS nos quesitos Econômico Financeiro e atenção à Saúde.)

Acompanhemos o desenvolvimento desse processo. Parece que não vem coisa boa daí.

11 setembro 2013

ANS quer restrição do controle do Poder Judiciário sobre agências reguladoras

Às voltas com o imbróglio da suspensão da comercialização de alguns planos de saúde por parte de algumas operadoras, a ANS declara, dentre outras coisas:

O controle do Poder Judiciário sobre atos das agências reguladoras, como a ANS, deve ser restrito.

Num regime que pretende ser de direito, o que a Agência Nacional de Saúde está querendo é que as leis não valham para sua atuação. Em toda situação levada à justiça, há a parte que se julga prejudicada por outra, e solicita decisão por parte de árbitro, devidamente reconhecido e conhecedor das leis, para decidir a quem cabe a razão. O poder judiciário se manifesta, para a saúde, como se manifesta para todas as lides da sociedade: avaliando riscos e decidindo, liminarmente ou não, sobre questão apresentada.

Ora, uma decisão que pretenda impedir a comercialização comunica que mensagem ao beneficiário-reclamante? Àquele que registrou sua queixa na ANS por negativa de atendimento, por exemplo?

Nada. Não diz nada. Este continua sem o atendimento. Mas o sinal é de que, para ele, solução não houve. Mas outros não vão enfrentar (em tese) o mesmo problema que ele. Como se fosse balsâmica a mensagem!

Está consagrado o direito de ampla defesa em nosso ordenamento jurídico. Quando uma agência reguladora pune sem direito à defesa (como alegam as operadoras neste caso), nós cidadãos precisamos temer as consequências. O povo nas ruas reagiu quando apanhou da PM sem motivo. É a punição sem julgamento e sem defesa. É o caso daquele tenente que jogou spray de pimenta em manifestantes pacíficos e, arguido sobre os motivos da agressão, respondeu: “Porque eu quis”. Simples assim.

A detenção irrestrita da razão gera os déspotas. Sua associação com outros que pensam da mesma forma gera as ditaduras. E de ditaduras entendemos bem.

Voltando ao que deveria ser o foco da atenção da ANS: como o beneficiário-reclamante foi beneficiado?

Ele estaria mais protegido se tivesse onde buscar, sempre que quisesse, indicadores de desempenho (atualizados, obviamente) de sua operadoras e compará-los com outras. Indicadores tais como:

  • Índice de reclamações (sim, ele é importante): mas não somente quantas, mas de que tipo. E como foi a solução do caso, se solucionado;
  • Índice que expresse a quantidade de médicos disponíveis por beneficiário, chegando às especialidades por beneficiário. E que, numa demonstração transparente, se demonstrasse também qual é o índice desejável;
  • Índice que expresse a quantidade de leitos de internação disponíveis por beneficiário, também com as especializações. Também juntamente ao índice do que é o desejável;
  • Quantidade média de espera para realização de consultas, exames e outros procedimentos e internações. Aqui, não importando se obedece aos prazos máximos (que são muito benevolentes – com as operadoras). Não sabemos, os beneficiários, qual é o tempo médio de espera. Sabemos, no máximo, qual é o prazo máximo que precisamos esperar. O tempo médio efetivo seria uma importante informação para embasar a malsucedida portabilidade;
  • E outros.

Registro de novo a regra inexistente sobre a quantificação de prestadores de serviços na saúde suplementar. A Consulta Pública 26, que pretendia regular a matéria, não se transformou em norma. Ora, pela lógica, se eu não sei qual é a rede necessária, como posso julgar que uma determinada é insuficiente? Se a regra existisse objetivamente, seria muito simples aplicá-la e constatar que a operadora está com insuficiência. Em não existindo, trata-se de mera ilação.

Assim como no caso da rede, também para a suspenção da comercialização deveria existir regras bem transparentes sobre sua aplicação. A simples avaliação, por parte da agência, de que há irregularidades, mas sem a apresentação de critérios e parâmetros bem definidos levará, naturalmente, à judicialização de qualquer matéria.

Costumo dizer que a ANS é a agência mais atuante do Brasil, normalmente como uma boa avaliação. Nos últimos tempos, infelizmente, sua atuação tem extrapolado.

Coloquemos o beneficiário no centro das discussões, por favor. Para matar a doença por inanição.

10 setembro 2013

A liquidação de operadoras–o caso de São Luís (MA)

Em recente comunicado, a ANS informa a liquidação de três operadoras de planos de saúde, duas delas situadas em São Luís (MA), a saber a Unimed São Luís e a Multiclínicas.

A Unimed São Luís tinha, em junho/2013, segundo dados da própria ANS, 55.760 beneficiários. A Multiclínicas tinha, segundo a mesma fonte, 11.252. A cidade toda tinha (ainda segundo a ANS) 320.271 beneficiários no total, dos quais 72.235 são de autogestões, portanto de planos não comercializados. A conta assusta: as operadoras liquidadas detinham, juntas, 27% (vinte e sete por cento) dos beneficiários da cidade (descontada a autogestão, que é um plano de saúde diferenciado).

Diz o texto do comunicado:

Os consumidores dessas operadoras têm 60 dias para optar por novo plano, sem cumprir carência ou cobertura parcial temporária.

Quer dizer, os beneficiários das operadoras liquidadas estão encarregados de procurar uma alternativa à operadora liquidada, por sua conta e risco, e ainda tendo de obedecer às normas da portabilidade especial (denominação dessa modalidade de transferência entre operadoras).

Segue ainda o comunicado da ANS (o grifo é meu):

A medida beneficia os 17.604 beneficiários da Unimed Guararapes; 55.760 da Unimed São Luís e 11 mil da Multiclínicas. Caso o beneficiário tenha contratado o plano há pouco tempo e ainda esteja em período de carência, deverá cumprí-la na operadora de destino.

Então, vamos analisar: a operadora é extinta, o cidadão deixa de ter a cobertura pela qual vinha pagando, tem de procurar outra operadora que ofereça um plano compatível com as regras da portabilidade especial (vale dizer: preço igual ou inferior), e isso é um benefício.

E, junto aos documentos necessários à transferência, ainda há necessidade de apresentar:

…e pelo menos quatro boletos pagos na operadora de origem, referentes ao período dos últimos seis meses.

O motivo da liquidação:

…em função do grave risco à continuidade da assistência aos beneficiários.

É preciso perguntar: liquidar a operadora e impor ao beneficiário o encargo de se ajustar à uma nova trouxe o quê, senão a extinção da continuidade da assistência aos beneficiários?

Como resultado, extinguem-se as obrigações de prestação de serviços a 27% do total de beneficiários de planos de saúde de uma cidade. As operadoras concorrentes devem estar felizes com a medida, pois se os beneficiários não conseguirem migrar nos moldes da portabilidade especial, terão de desembolsar valores mais altos para adquirir um novo plano de saúde, sem garantia de dispensa de carência.

No fim das contas, a medida obteve o que queria evitar. Os beneficiários estão à mercê do mercado e dos maus administradores.

Afinal, o monitoramento da ANS  não permite identificar essas catástrofes com antecedência? Então, para que serviriam?

Muita saúva, e pouca saúde…

O paciente informado

Com tanta informação disponível, a vida anda dura para aqueles profissionais acostumados a não conversar com seus pacientes. Antes de ir ao médico, esses pacientes se informam. Internet, amigos e mesmo profissionais de saúde os auxiliam a enquadrar seus sintomas em alguma patologia, o que faz com que cheguem ao médico com alguma direção já escolhida. Há mesmo aqueles que fazem suas listas de perguntas e sintomas, e as discutem com os médicos na busca do melhor diagnóstico. Não necessariamente o médico gosta disso.

Espremido entre várias consultas numa mesma hora, pressionado pelos consultórios lotados, e com a agenda lotada por várias semanas e mesmo meses, alguns médicos querem mesmo é dar vazão à demanda. Ou seja, menos conversa e mais produção (vale dizer: pedidos de exames).

O excesso de demanda não é a favor do paciente/beneficiário. O médico pode desconsiderar informações importantes no diagnóstico. Mas como o negócio não pode parar, paciência. A confiança nos exames é tanta que compensa a falta de diálogo. igualmente, a dependência dos exames é tamanha que o diálogo é igualmente dispensável.

Mas não deve o paciente se conformar com um atendimento burocrático. No país do Mais Médicos, combatido pelos nacionais, em que uma consulta pode demorar até seis meses (com o especialista de sua predileção), o diagnóstico deve ser recebido com reservas. Não há que se confiar absolutamente no médico, cuja falibilidade está nos mesmos patamares que os demais seres humanos. Principalmente se a recomendação é uma cirurgia de alta complexidade ou alto risco. O paciente informado compara o diagnóstico com outros casos com mesmas características e, se for o caso, busca uma segunda opinião, mesmo uma terceira ou quarta.

Ocorre que o beneficiário/paciente procura o médico normalmente com a doença instalada. Ou seja, há uma pressão de desconforto físico, ou mesmo uma condição de agravamento de condições de vida. O médico, seja qual for sua recomendação, a fará a um ser fragilizado e carente de solução. E, nesse momento, acontece algo semelhante à síndrome de Estocolmo, já que o paciente/beneficiário se apegará às recomendações daquele que vira a ser, na sua visão, o seu salvador.

Normalmente as operadoras de planos de saúde (OPS) têm, dentre suas práticas regulatórios, elementos que permitem identificar os procedimentos solicitados que estejam fora dos padrões normais. Um deles é justamente a segunda opinião, geralmente em médico de confiança da OPS, o que trava o processo, pois o paciente quer mesmo é alguém de sua confiança. Deveria mesmo ser regra a autorização, sem incidência de co-participação, de consulta de segunda opinião para procedimentos de alta complexidade e/ou alto custo.

Precisamos lembrar que a prática médica é uma atividade financeira, e que os procedimentos (cirurgias, por exemplo), via de regra, pagam mais que o valor da consulta.

Para ilustrar, três casos:

1 – Mulher jovem, com dores no joelho, recebeu recomendação de cirurgia imediata nos meniscos. Com dificuldades para se ausentar das aulas, procurou dois outros profissionais, que reforçaram a necessidade de cirurgia. Já um quarto médico, atento às dificuldades da jovem, recomendou musculação dos músculos adjacentes, reforçando que se tratava de medida para tentar evitar a cirurgia. Decorridos mais de 12 meses, a jovem está em plena atividade. Sem cirurgia.

2 – Homem com problemas de sono procurou especialista em sono. Após exames, a recomendação: a cirurgia do ronco. Os exames apontaram apneia leve e ronco leve. Informando-se sobre a cirurgia, principalmente o pós-operatório, resolveu procurar outro médico. Sem mencionar o nome do primeiro, falou sobre a cirurgia. O segundo médico se surpreendeu, pois a a taxa de sucesso, segundo ele, é de 60%. E adotou outros procedimentos não invasivos que restituíram o sono do paciente.

3 – Homem com dores na coluna lombar recebeu diversos encaminhamentos para fisioterapia. À vista do quadro geral, o diagnóstico era de que a dor, já crônica, acompanharia o paciente pelo resto da vida. Pesquisando, o paciente descobriu uma técnica de fisioterapia não coberta pelo plano de saúde, mas resolveu tentar, pois a alternativa era cirúrgica. A dor se foi, e o homem retomou todas as atividades normalmente. Aqui, o plano de saúde pagou sem resultado por diversas sessões de fisioterapia, mas ressonâncias magnéticas. Tivesse bancado a fisioterapia não convencional, teria resolvido o problema a um custo muito menor. E ao médico, em cuja clínica aconteciam as sessões de fisioterapia, restam questionamentos sobre seu interesse direto na realização das sessões.

Não é à toa que a judicialização acontece!