28 dezembro 2012

A Saúde Suplementar em 2013

 

A chegada da United Health ao Brasil mostra que o mercado ainda é atraente, apesar das reclamações das atuais operadoras. A líder do mercado americano não se aventuraria se não tivesse projeções favoráveis no rigoroso mercado brasileiro. Mas ela adquiriu uma empresa estruturada, verticalizada e profissionalizada em termos de gestão e gestores. Desse jeito, a conta deve fechar.

Os prestadores de serviços médico-hospitalares são uma parte importante desse tal processo de cuidar das pessoas. Isolado, entretanto, ele não é eficaz. A Amil entendeu isso, bem como entendeu a importância de conjugar os custos da prestação de atendimentos ambulatoriais e hospitalares com as necessidades do paciente (que é o beneficiário adoecido). E na sua receita de crescimento incluiu a compra de carteiras de operadoras, mas expandiu a rede adquirindo também hospitais. De forma geral, contém os custos dirigindo os atendimentos à sua rede, sempre que possível. Os números permitem concluir que a receita tem resultados bons.

Autogestões e verticalização

As autogestões não têm tradição de manter rede própria, exceto ambulatorial, exceção restrita às grandes. A maioria nem tem condições de operar assim, e seria realmente temerário se cada uma resolvesse se embrenhar por esse caminho. Além de ser um negócio (sim, é um negócio, queiram ou não) com conhecimentos específicos, o risco é alto demais para um “setor de RH gerenciar.

Dessa forma, a “solução AMIL” não cabe às autogestões.

Seguradoras e verticalização

Por uma questão legal, Seguradoras não podem ter rede própria. Inicialmente trabalhando com rede referenciada, depois passando ao credenciamento, essas empresas tiveram de passar por uma fase pesada de adaptações de negócio depois que a ANS foi criada e substituiu a SUSEP na condução da saúde suplementar.

Dessa forma, às seguradoras não cabe a “solução AMIL”.

Filantropias e Medicinas de Grupo

As medicinas de grupo, modalidade em que se enquadra a AMIL, é a que tem maiores condições de equilibrar seus custos com uma rede abrangente.

Não o fará, entretanto.

Historicamente, as medicinas de grupo se formaram em função do atendimento de um hospital (ou um grupo), que resolveram ampliar sua atuação fidelizando seus clientes num plano de saúde. Campeãs de vidas antes da Lei, tiveram muita dificuldade para se adaptar, tanto que várias fecharam imediatamente, e outras vêm sendo liquidadas ao longo do tempo pela ANS. As mais estruturadas acabaram sendo alvo da AMIL, que se baseou nesse tipo de aquisição para seu crescimento vigoroso. No caso mais emblemático, está a compra da Medial Saúde, que tinha uma rede própria bem vistosa.

Ademais, quando se fala de aumentar a rede, a medicina de grupo se depara com um dilema: aliar-se a outros hospitais (dos quais parte tem relação societária com operadoras) é oferecer a garganta á guilhotina, e nesse mercado o medo do canibalismo é o monstro debaixo da cama. Cada medicina de grupo enxerga a próxima como concorrente, o que impede maiores negociações entre elas.

Ah, sim, as filantropias. Normalmente são entidades seríssimas, com belos projetos de saúde e bem estar, mas afogadas em dificuldades financeiras e mesmo dívidas. Estão mais preocupadas em sobreviver, e enquanto não saírem desse estado, não se ocuparão em resolver outros (graves) problemas, já ensinava Abraham Maslow.

Dessa forma, a “solução AMIL”, embora possível, parece improvável.

Cooperativas médicas

Dentre as cooperativas médicas, há as Unimed, sendo que muitas têm serviços próprios (hospitais, ambulatórios, pronto-atendimento, SADT). Seu grande diferencial é que, pelo intercâmbio, os beneficiários de uma Unimed podem utilizar os serviços de outras (rede própria ou credenciada), o que poderia transformá-las em candidatas naturais à “solução AMIL”.

Na prática, cada Unimed é uma. Singular, que é como se chamam mutuamente (aquelas que não associações de Unimed). Sendo mais de trezentas e cinquenta cooperativas, o grande público as enxerga com uma entidade única, o que não corresponde bem ao seu dia-a-dia. Cada qual tem seu viés administrativo, cada qual tem sua visão de custos (e preços, portanto). Além do mais, as regras de pagamento e cobrança de intercâmbio acabam eliminando o que poderia ser vantagem competitiva, pois o hospital é também um negócio, inclusive atendendo a outras operadoras de planos de saúde.

A “solução AMIL”, portanto, para ser almejada pelas cooperativas, precisaria de uma mudança de paradigma entre as Unimed que parece ser de execução bem difícil.

2013

O ano de 2013, portanto, continuará sendo parte da transição empresarial de que tanto se fala. Já se noticiou a negociação entre a Golden Cross e um grupo estrangeiro, o que deve ser a tônica para as grandes operadoras em 2013. Mas isso para as grandes.

As autogestões continuarão nos seus esforços para transformar a prevenção em resultados palpáveis, e a falta de demonstrações mais sustentáveis de retorno de investimento será o grande adversário. A pulverização das vidas dessa modalidade também deve ser problema a ser combatido, e vejo que somente uma atuação conjunta das associadas da Unidas (associação de classe da modalidade) pode solucionar essa barreira.

As seguradoras continuarão a ser os grandes alvos de reclamações de prestadores de serviço, e sua direção somente será dada após uma grade tendência surdir no mercado. Por sua atuação fortemente empresarial, têm todas as condições de enfrentar a questão da prevenção de doenças e riscos e promoção da saúde. Mas sua origem empresarial limitará as ações ao público que realmente demonstre ter custos suscetíveis a diminuição (doentes crônicos graves, casos de custos altíssimos, etc.).

As medicinas de grupo, excetuada a AMIL e uma dezena de honrosas exceções regionais, continuarão na sua luta pelo azul contábil, até que despertem interesse em grupos empresariais maiores ou até que ousem firmar parcerias com aqueles que hoje enxergam como concorrentes. A força desta modalidade estará na união, como demonstram as cooperativas. Mas paixões terão de ser debeladas antes que isso aconteça. O ano de 2013 deverá ser de calor para esta modalidade (mais as filantropias), calor para equilibrar suas contas.

As cooperativas têm demonstrado ações no sentido das melhores práticas de mercado. Várias buscaram profissionalizar suas equipes de gestão, e algumas têm experimentado uma sólida evolução. Mas o ano 2013 deve manter mais do mesmo, com a tendência de mais problemas em cooperativas com dificuldades financeiras.

A ANS deve manter suas ações regulamentadoras e regulatórias, como demonstra a Consulta Pública sobre este assunto. Ainda sem um presidente indicado pela presidente da república, não se sabe, entretanto, que rumos poderá tomar, a depender de quem assumir a agência. O fato é que a publicação de mapas na internet e a agenda em conjunto com o ministério da saúde não trazem resultados práticos eloquentes. O fato de impedir operadoras de planos de saúde de comercializarem seus planos não resolvem os problemas dos beneficiários com dificuldades, embora tragam dificuldades para as próprias operadoras. O mercado criticou muito a agência por seus dirigentes egressos do mercado, supondo que estes defenderiam interesses escusos, o que não ocorreu. Também não ocorreu o inverso. O ano de 2013 seria excelente, entretanto, se a ANS conseguisses aglutinar interesses em torno de si para viabilizar o avanço de suas medidas para a rede prestadora de serviços; se atuasse imediatamente na questão dos custos abusivos de órteses e próteses; se regulasse mais decisivamente em função de indicadores e menos em função de estruturas (ouvidorias ou processo de atendimento ao cliente?); se tornasse mais célere a adoção de medidas protetoras de beneficiários com dificuldades; se agisse no sentido de manter operadoras (e seus beneficiários), em vez de liquidações e portabilidades especiais. É, talvez um ano seja pouco…

Para encerrar, um clichê: 2013 será um ano decisivo (como foram todos até agora).

10 dezembro 2012

Autogestões–Operadoras diferenciadas

Dentre as modalidades de operadoras de planos de saúde, uma se destaca pelo caráter não comercial: a autogestão.

A operadora na modalidade Autogestão diferere, em síntese, das demais modalidades:

  • pela limitação na prestação de serviços: funcionário (ativos ou aposentados), grupos familiares, etc., da empresa (ou das empresas) responsável pela operação;
  • a ausência de lucro nos objetivos empresariais da empresa (embora não se furte a buscar resultados financeiros positivos na atuação).

(Empresas públicas que administrem diretamente seus planos de saúde não estão sujeitos à legislação da saúde suplementar.)

As autogestões têm atuação diferenciada no mercado de saúde suplementar. É mais correto dizer que os planos de saúde são um benefício oferecedo pelas patrocinadoras das autogestões, o que as coloca em posição de enxergar a operação de forma diferenciada.

Focando o bem estar do funcionário e sua família, a autogestão faz contas diferentes em relação ao mercado. Não é o valor do atendimento, mas o impacto geral no ânimo do trabalhador. Para exemplificar, conheço autogestões que não se restringem ao atendimento médico-hospitalar na sua atuação: subsidiam (ou mesmo pagam integralmente) itens como gás de cozinha, óculos, medicamentos diversos (desde que prescritos, e não somente para doenças crônicas) interal ou parcialmente, etc.

Assim, o que seria lucro reverte-se para mais benefícios.

Mesmo na atividade que parece ser o maior desafio das operadoras de planos de saúde, o da promoção da saúde e prevenção de riscos e doenças as autogestões estão um passo à frente (ou poderiam estar).

Na maioria as OPS, a dispersão dos beneficiários é tal que a aplicação de ações e atividades de prevenção e promoção tem custos que as tornam proibitivas, embora ações venham sendo empreendidas por medicinas de grupo que têm rede com uma certa abrangência. Mas os resultados práticos têm feito refluir as iniciativas dessa espécie, sempre do ponto de vista financeiro.

Autogestões têm um ponto comum aos beneficiários, que é o local de trabalho. Torna-se mais fácil empreender ações para seus beneficiários, sejam eles ativos, aposentados ou mesmo dependentes. O afluxo é mais natural, até por causa da relação que os beneficiários têm com a empresa. E, de fato, há muitas ações de relativo sucesso no Brasil envolvendo autogestões.

Apesar de suas vantagens, as autogestões têm vários problemas comuns às demais operadoras. A sinistralidade (ou custos crescentes, já que sinistralidade é um conceito nem sempre aplicável às autogestões) é um deles. Ações de regulação que são adotadas pelas operadoras comerciais também o são pelas autogestões, embora com rigor menor quando envolve diretamente atendimento ao beneficiário. Negociações com a rede prestadora, dificuldade de manutenção da rede (em função de volume de atendimentos, dispersão, práticas monopolistas de algumas áreas) são as maiores ameaças à modalidade de autogestão.

Além disso, há autogestões que enfrentam graves problemas financeiros (causados por uma confluência de fatores, mas que não podem ser ignorados), o que leva a modalidade a questionamentos por parte das próprias patrocinadoras. Um dos maiores problemas é a expertise dos profissionais das autogestões em enfrentar problemas conhecidos de mercado, já que eles são, normalmente, pessoas do departamento de recursos humanos designados para atuar em área de conhecimento diverso daquele necessário à sua atribuição inicial. Com honrosas exceções (principalmente nas grandes autogestões), de fato é uma grande dificuldade que levou ao encerramento de diversas autogestões (algumas pioneiras nesse segmento, que de operadoras passaram a ser contratantes de planos de saúde).

Adicionalmente, há entidades públicas de autogestão (sem registro na ANS, dispensadas que são) que enfrentam gravíssimas dificuldades financeiras, arrastando com elas diversos prestadores de serviços médicos hospitalares pela falta de pagamento. Tal realidade depõe contra as autogestões de fato, ciosas de seu dever de bem administrar e oferece serviços da melhor qualidade.

Tudo sopesado, minha avaliação é que a autogestão é a melhor modalidade de operação de planos de saúde. É a mais flexível, a de maior facilidade de integração com o beneficiário, e a de maior possibilidade de sucesso no desafio de reduzir custos e enfrentar o crescimento das doenças crônicas e do envelhecimento da massa. Mas é preciso que haja uma ação coordenada, planejada, orquestrada com objetivos bem definidos para garantir sua presença nesse mercado bem inóspito.

Nesse caminho, vejo dois atores que podem consolidar decisivamente a força da autogestão: A CASSI (dos funcionários do Banco do Brasil) e a Unidas (entidade de classe das autogestões). A primeira com uma rede das mais abrangentes e diversificadas. E a segunda como força orquestradora, ambas atuando em conjunto para oferecer base para que empresas de cinco, dez ou cem mil funcionários se organizem em autogestão e tenham um mínimo de rede prestadores, tecnologia e base de conhecimento para atuação. Se as cooperativas podem, por que não as autogestões?

26 novembro 2012

Capacidade de atendimento dos planos de saúde

Recente entrevista de representante de operadoras brasileiras de grande expressão trazia a afirmação de que não haveria problemas com a capacidade de atendimento da rede de prestadores de serviços da Saúde Suplementar no Brasil.

Permito-me discordar.

Numa conversa recente com um presidente de uma operadora de planos de saúde de grande porte, ele mesmo um médico, reclamava ele das dificuldades de conseguir agendamento para um atendimento de familiar na rede credenciada para uma consulta, mesmo sendo ele o presidente da operadora. Na sua avaliação, isso se deve ao momento econômico do Brasil, em que houve o crescimento da “classe média”, que vai ao médico e paga, à vista, de três a quatro vezes (no mínimo) o valor que o médico receberia por uma consulta do plano de saúde. Isso seria determinante para uma inversão na fila de atendimento, em que a prioridade passa a ser do emergente na classe de consumo.

Ainda segundo esse médico, houve uma época em que se esperava no SUS um tempo absurdamente grande. Os primeiros planos de saúde se fiaram nisso e ganharam terreno na oferta de atendimentos mais rápidos, ainda que com custos altos, mas acessíveis. O que se vê hoje é a transformação daquele cenário, onde o próprio atendimento do plano de saúde se equipara ao SUS, mas o “paciente” tem como pagar. E está criado o problema.

No período de 2003 a 2011, enquanto os planos de saúde tiveram crescimento (de 2003 a 2011) de 41,3% (segundo a ANS), a classe C experimentou crescimento de 46,3% (segundo a FGV). O aumento foi proporcional para ambos, beneficiários e planos de saúde e Classe C. O que explica, então, esse comportamento atípico de pagar pelas consultas?

Podemos somente especular, mas parece-me que a urgência de atendimento médico (não no sentido da lei, mas a pressa em descobrir uma possível doença) é uma dessas explicações. Depois, que impacto tem uma consulta a R$ 120,00 se isso oferecer maiores possibilidades de tratamento? Ainda mais se esse tratamento será coberto pelo plano de saúde, de forma integral, e a custos, aí sim, muito maiores?

Pois bem, parece que esse é um problema para as operadoras, em vez de sê-lo para os médicos. Estes estão surfando na onda da demanda e oferta, escolhendo atender àqueles que pagam mais. Ao passo que as operadoras ainda estão na raciocínio de que pagar pouco ao médico é uma boa política, preferindo fechar os olhos para os benefícios da prevenção de riscos e doenças e promoção da saúde, e da própria descoberta precoce de doenças mais graves (ou mais custosas).

Hospitais não têm essa mesma liberdade que os médicos. Seus custos ainda são inacessíveis, mesmo para a classe A e B. Assim, as consultas são particulares, e as cirurgias, tratamentos, investigações ais caras serão pelo plano de saúde.

A realidade crua é que as operadoras só vão sair desse paradigma médico-deve-ser-barato por ação direta da ANS, como no caso dos prazos máximos de atendimento (ressalvadas suas limitações) e por pressão direta dos consumidores e suas representações (Procon, ProTeste, etc.). Pois exceção feita aos planos Premium, os reembolsos de consultas feitas aos beneficiários não são muito melhores do que os valores pagos diretamente aos médicos. Quando o valor das consultas pagas de forma direta pelos consumidores começar a pesar em seu bolso, aí haverá o movimento de beneficiários, Antes disso, é pura utopia.

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Crescimento da Classe C (fonte: aqui).

01 outubro 2012

A agenda da ANS

Primeiro, foi o impedimento à comercialização de planos. Depois, veio a Consulta Pública sobre medicação domiciliar. A seguir, a Consulta Pública sobre ouvidorias. Imediatamente, a Consulta Pública sobre a negativa de autorização.

Desavisados poderão confundir a atuação da ANS com a do Procon. Aliás, no episódio do impedimento à comercialização, a comunicação foi conjunta com o Ministério da Saúde, dando a entender que tratava-se de uma orquestração maior, percepção imediatamente ampliada pela suspensão da venda de chips de operadoras telefônicas. E as operadoras punida brandiram, com certa razão, seus argumentos com relação às NIP recebidas, e que tiveram acolhida por parte da ANS.

A medicação domiciliar é uma medida já estabelecida pelo SUS, para os casos de doenças crônicas. Para operadoras de planos de saúde, nada mais lógico do que gastar alguns reais em um anti-hipertensivo e evitar uma complicação de saúde que custará muito mais. Mas a informação é essencial para que medidas como essa sejam tomadas. Com a proibição (mais corretamente: com a falta da exigência) do CID nas contas médicas e pedidos de autorização, limita-se muito a capacidade da operadora em conhecer informações sobre a saúde de seus beneficiários, mesmo que para tomar ações em seu benefício. A operadora tem de se basear em doenças auto-referidas para identificar seus crônicos. Ou, por silogismo, a partir da utilização de serviços médicos hospitalares, concluir que tal beneficiário PODE SER um provável crônico. A ironia, aqui, é que depende-se da receita médica para obtenção do benefício no SUS. Ou seja, ainda sem o CID, mas quase lá… E cabe ressaltar que a ANS está propondo o benefício como cobertura adicional, não como uma exigência de fornecimento, que mostra saber ela que a medida é cara e polêmica.

Na questão das ouvidorias, A Unimed Paulistana tem Ouvidoria. Assim como a Amil. Uma teve a comercialização de planos suspensa. A outra figura como uma das mais reclamadas do setor. Como se infere, então, que a simples presença de ouvidorias pode garantir qualidade aos beneficiários? Diferentemente de estabelecer uma estrutura contábil a ser seguida pelas operadoras, não cabe à ANS definir componentes da estrutura organizacional. Os custos envolvidos com a criação desse apêndice estrutural se somam aos já pesados encargos das operadoras, sem que haja uma mínima contrapartida de qualidade, como os exemplos citados já mostraram.

A negativa de autorização, entretanto, é um marco positivo. Tão positiva que deveria figurar dentre os procedimentos obrigatórios para TODOS os serviços essenciais. Não é raro que sejam negados procedimentos, e nem sempre por motivos injustos. Mas há ocasiões em que a autorização realmente não sai, ou demora tanto para sair que asa consequências para o beneficiário são péssimas. Saber por que seu procedimento foi negado é um direito do consumidor/beneficiário, e a medida é muitíssimo benvinda.

Mas, retrospectivamente, notamos que a agenda da ANS tem a ver com o consumidor. É bom que assim seja, e é péssimo que seja somente assim. O consumidor de planos de saúde (erroneamente chamados de “convênios”) estava sem proteção alguma, e a lei não garantia a execução de seus pressupostos. Na figura da agência reguladora, a ANS (a mais atuante das agências reguladoras, faço questão de ressaltar), muitas áreas de sombra estão sendo iluminadas para beneficiar a parte hipossuficiente, o beneficiário.

O que não se pode ignorar, nem esquecer, é que há uma estrutura voltada para a garantia desses benefícios. O cenário se compõe de Operadoras de Planos de Saúde (OPS), prestadores de serviços médico-hospitalares (PSMH) e beneficiários (com um destaque para os contratantes de planos coletivos). Quando a ANS se volta para os beneficiários, está focando somente numa das bases do tripé.

Prestadores de Serviços médico-hospitalares

A ANS não age diretamente sobre os PSMH. Mas exige, corretamente, que OPS mantenham contratos com eles em números suficientes para garantir atendimento. Como se calculam esse números? Não se sabe. Há a Consulta Pública 26, que não virou Resolução Normativa, mas que baliza cálculos do setor. Mas sua aplicação exata não garante o atendimento, infelizmente. Esta deveria ser uma preocupação da ANS:agir sobre PSMH. É notória a unimilitância, em que os médicos cooperados atendem somente à sua cooperativa ou clientes chamados particulares. A ANS agiu proibindo que a prática figurasse nos estatutos das cooperativas. O resultado? Estatutos sem a cláusula, mas médicos praticando-a. Na prática, existe a unimilitância. Isso parece não preocupar a ANS. A falta de médicos, que causa o aumento do tempo de atendimento ou o atendimento em pronto socorro (ou pronto atendimento) é uma consequência nefasta disso. Mais que a falta de ouvidoria…

A falta de hospitais é um dos grandes problemas estruturais do setor. O hospital que tem 300 leitos os tem para TODAS as OPS com quem tem contrato de credenciamento. Ou seja, quem chega primeiro se interna, os tardios esperam. Estudos de entidades de classe demonstram a escassez desses recursos, mas a atuação conjuntural parece não fazer parte das atribuições da ANS. Sem reconhecer que este problema não é exclusivo das operadoras, mas um problema do Brasil não se chegará a um debate sério para resolver esse problema. Mais hospitais, com mais recursos, essa é uma necessidade real e urgente. E não adiantará multar OPS que não consigam internar seus beneficiários em 21 dias (úteis), que o problema não se resolverá.

Custos de órtese/prótese

No meio da saúde, é famosa a questão dos custos de órteses e próteses. Variações de preço, para uma mesma peça, que chegam a 2.000%. É um enorme ofensor dos custos, e uma grande ameaça à saúde financeira das OPS. Em vez de se debruçar sobre essa questão, que tal estudarmos o fornecimento de medicamentos aos beneficiários?

Indicadores na Saúde Suplementar

Desde há muito sinto falta de indicadores na saúde suplementar. Os prazos de atendimento estabelecidos pela ANS de certa forma respondem a esse clamor. Mas ainda é muito pouco. Logo após a edição das RN que tratam dos prazos máximos de atendimento, várias operadoras afirmaram que já atendiam a esses prazos, com tempos ainda menores. Antes do estabelecimento desses prazos, foi feita uma pesquisa com algumas operadoras, mas com números jamais revelados. Eu, como beneficiário, gostaria de saber quem são os mais rápidos a autorizar uma cirurgia eletiva, por exemplo. Assim como gostaria de saber quem são as OPS que têm maior relação de médicos por beneficiário, as que tem maior índice de negativas, as que… enfim, gostaria de saber de indicadores. É preciso que haja uma base de comparação para que o beneficiário escolha uma OPS, ou para que estas estabeleçam processos de melhoria em função de benchmarking de mercado. Tal não é, entretanto, o entendimento da ANS.

Conclusão

A ANS é, de longe, a agência reguladora mais atuante do Brasil. Sua atuação tem se pautado, entretanto, visando o bem exclusivo dos beneficiários e, subsidiariamente, dos PSMH (como demonstram as exigências de contratualização, o Programa Olho Vivo, etc.). O setor, entretanto, precisa de garantias de equilíbrio. A judicialização da assistência médica é outro fator que vem pesando nas contas das OPS. Sem pensar na Saúde Suplementar como um todo conectado e interdependente (a típica relação da Teoria Geral dos Sistemas), corre-se o risco de imputar a um dos atores uma carga desnecessariamente onerosa, arriscando-se mesmo levar esse ator à exaustão. E, nas ações da ANS, esse tipo de abordagem nunca foi o padrão. Os beneficiários devem se sentir amparados pelas ações “proconianas” da ANS. Aqueles que analisam atividades e números do setor, entretanto, têm motivos para temer uma forte crise no setor, em alguns anos, se o equilíbrio não se restabelecer. E, gerada a crise, quem mais vai sofrer é o beneficiário, hoje o suposto objeto das ações.

A ver.

25 agosto 2012

ANVISA, os remédios de faixa vermelha e os prazos de atendimento

Recentemente foi divulgada a informação de que a ANVISA quer exigir receita médica para os remédios de faixa vermelha.

Ao mesmo tempo, a ANS está punindo operadoras por desrespeitarem o prazo máximo de atendimento aos beneficiários em procedimentos na rede credenciada.

A relação entre os dois fatos é que a ANVISA pode, com essa resolução, piorar o prazo de atendimento e infernizar ainda mais a vida das operadoras de planos de saúde (OPS).

Se para suas consultas decorrentes de queixas de saúde o beneficiário de planos de saúde já enfrenta uma dificuldade enorme, em especial para consultas, caso tenha de solicitar receita ao médico para comprar, por exemplo, o anticoncepcional, haverá a potencialização do problema. Além dos anticoncepcionais, há outros remédios de uso frequente que serão atingidos pela nova norma: alguns anti-inflamatórios, remédios para doenças crônicas, etc.

Não se pretende aqui estilar o consumo indiscriminado de remédios. Mas, como registrou Guilherme Hummel, com o brilhantismo usual, automedicação é diferente de autoprescrição. Se o médico recomendou o consumo de determinado medicamento para certas situações, há a prescrição e há a incidências dessas certas situações. O que pode impedir o paciente/beneficiário de utilizar a mesma medicação sem a receita? O caso do anticoncepcional é emblemático. Também o é o uso de hipertensivos.

Caso seja mantida, a fila nos pronto-atendimento deve aumentar. Pessoas passarão horas nas filas de atendimento para obter receitas de remédios já em uso normal e sem complicações.

Guilherme Hummel lembra também que, nessa fase em que governos, órgãos e entidades de saúde conclamam o indivíduo a se responsabilizar pela sua saúde, não podemos tirar dele essa responsabilidade de consumo consciente da medicação. Tutelá-lo implica em reconhecimento de sua incapacidade de ser responsável pela sua saúde. E, mais uma vez, o amarramos à grande teia de dependência dos prestadores de serviços médicos hospitalares, que não é exatamente abundante no Brasil.

Se realmente for adotada, a regra terá impactos negativos em toda a cadeia de saúde, Acredito até mesmo que os próprios médicos, já assoberbados e com agenda lotadas, se ressentiram de atenderem paciente para renovação de receita. Ou, pelo jeitinho brasileiro, o paciente sai da primeira consulta com um bloco de receituário já preenchido.

Muita saúva e pouca saúde, os males do Brasil são.

23 julho 2012

Ainda sobre a punição às operadoras

Causou estranheza a comunicação feita em conjunto pela ANS e Ministério da Saúde sobre a punição às operadoras. Não que, embora independentes, as agências não tenham que trabalhar com órgãos correlatos, em especial numa área de grande deficiência como a saúde. O que causou espécie foi ver que o anúncio teve ares de festejo, numa época em que começarão ações de palanque. Mas que problemas há, isso é inegável, daí porque apoiarmos a ação de caráter educativo/punitivo.

Mas vai que, dias depois, surge uma punição semelhante a operadoras de telefonia celular.

Em ambos os casos, as empresas punidas argumentam que houve mudanças de critérios e que a punição era exagerada. Operadoras de planos de saúde também argumentam que providências adotadas, mesmo aprovadas pela ANS, foram desconsideradas na hora de apurar o montante de reclamações.

Como em ambos os setores há reclamações demais, passa desapercebida a provável ação eleitoreira da(s) medida(s).

No caso da telefonia, uma decisão judicial no Rio Grande do Sul garantiu descontos proporcionais às falhas aos usuários envolvidos.

No caso das operadoras de planos de saúde, a única medida (não judicial) foi a suspensão da venda. Ora, se a rede da operadora não está ajustada, esperava-se que houvesse uma medida de ajuste, ao menos um projeto de ajuste ao longo do tempo. O que não houve.

Hoje, 23/07/12, a Folha de São Paulo publica reportagem em que mostra a insuficiência de leitos na rede pública, ao mesmo tempo em que afirma que há mais facilidade para acesso a médicos nessa rede que nas redes de operadoras de planos de saúde. E notícias ainda dão conta de que haverá, nos próximos dias, paralisações de algumas categorias de médicos contra as operadoras de planos de saúde.

Resumindo: as operadoras de planos de saúde foram punidas, mas têm dificuldade em manter sua rede. Na área pública (portanto, de acesso direto pelo governo) não há leitos e nem punição.

Fica uma pergunta: como se calcula o dimensionamento da rede credenciada? A ANS tem uma Consulta Pública não transformada em norma (a de n° 26). E o Ministério da Saúde tem uma regra (Portaria 1.101/02) para rede pública que pode valer no máximo como referência. Assim, as OPS podem considerar sua rede mais que suficiente, enquanto a Agência pode considerá-la menos que insuficiente.

Ah, o fato de não poder comercializar NOVOS PLANOS de saúde não alivia em nada, absolutamente nada, aqueles consumidores que tiveram e estão tendo problemas com o atendimento. Para eles, a satisfação de ver a OPS punida é quase nula, pois o que esperam mesmo é a garantia de seu atendimento. Aqueles que ainda sobrevivem, claro.

Parafraseando Macunaíma, “muita regra e pouca saúde, os  males do Brasil são”.

 

Errata: na publicação original, no lugar do Ministério da Saúde coloquei, incorretamente, ANVISA.

11 julho 2012

A punição às operadoras de planos de saúde pela ANS

Anunciada ontem punição aos planos de saúde que descumpriram os prazos de atendimento regulamentados pela ANS. As empresas punidas estão proibidas de comercializar alguns de seus produtos, até que se constante que o problema foi resolvido.

É um refresco para o consumidor saber que há alguém (uma entidade, no caso), que se preocupa com a satisfação de suas necessidades, contratadas perante uma determinada empresa. Por isso, comemorou-se a medida. A pergunta é: para aqueles prejudicados com a falta de atendimento, quais medidas concretas garantirão esse atendimento?

As regras da ANS já tratam disso. E são claras. Mas fazer cumpri-las é outra história. O reembolso integral das despesas deve ser feito, assim como o atendimento deveria ser prestado em um determinado prazo máximo. Se um não foi cumprido, por que o outro seria?

Dentre as operadoras punidas, há empresas de porte significativo, o que nos leva a concluir que o problema não atinge as empresas somente por causa do porte. Se a punição evoluir para intervenção, será que a Agência se surpreenderá com o locaute dos prestadores de serviço? Ou será que os processos internos das operadoras são pobres? Ou…

Apesar de ser louvável a medida, e de longe uma das mais assertivas dentre as adotadas por agências reguladoras, o consumidor que espera seu atendimento (acima dos prazos) ainda se vê em meio a uma tremenda batalha para consegui-lo. Nem todos vão se fingir armados, nem todos registrarão sua queixa. Como no caso das empresas aéreas, poderia haver um juizado especial que desse agilidade aos processos de atendimento solicitados e não atendidos no prazo. As famílias dos consumidores que vierem a óbito em decorrência de falta de atendimento não se consolarão com as multas.

04 julho 2012

Garantias de atendimento–Prestação de contas da ANS

A ANS publicou hoje documento sobre o acompanhamento da garantia de atendimento. Logo após consumidora fingir estar armada para garantir o atendimento de seu pai num hospital.

As Resoluções Normativas 259/268, que tratam do assunto, merecem aplausos pela normatização dos prazos máximos de atendimento. Mas peca num aspecto básico: não garante de fato o atendimento. As operadoras submetem às sanções previstas, mas aquela vida ameaçada no momento da necessidade não atendida não se beneficia dessas sanções.

O principal aspecto que faz falta á normatização é a definição de um processo, rígido e informatizado, que garanta a efetiva fiscalização. E uma ação, direta e rápida, garantindo o atendimento. Economicamente, a multa pode ser menor que o tratamento negado (ou postergado), e a multa ainda está sujeita aos recursos de praxe.

A justiça decide, liminarmente, sobre assuntos urgentes. A ANS não tem esse poder. Nem tem o poder de fazer com que a operadora cumpra as normas, senão o de aplicar cominações ao comportamento indesejado.

Assim, a normatização sobre os prazos máximos pode gerar uma série de problemas às operadoras, mas não chega a ser garantia da resolução de problemas dos consumidores. Até porque estes não têm o hábito, embora devessem, de ler as regras impostas às operadoras.

Útil seria, assim como nos casos da aviação civil, que houvesse uma instância a quem recorrer e que pudesse decidir de maneira rápida e decisiva, sem necessariamente ser o processo judicial de praxe. Aquela consumidora, que se fez agressora para se defender de uma agressão, poderia usufruir do mesmo resultado – o atendimento ao pai, sem a exacerbação de seus próprios direitos.

No país das leis, esta pode ser uma daquelas normas que punem, mas não beneficiam de fato ninguém.

11 junho 2012

Prevenção de doenças e os atores da saúde

Atividades preventivas já estão no discurso de operadoras de planos de saúde, já que o setor está chegando ao limite de sua capacidade de aprimorar cobrança (geração de receita) e pagamentos (contenção de despesas assistenciais – vale dizer: glosas).

Inúmeros relatórios de entidades/autoridades no assunto saúde apontam na mesma direção: três fatores que podem ajudar na prevenção de doenças são a alimentação saudável, a atividade física e a eliminação do tabagismo. Hábitos pessoais, portanto. Questões vinculadas à hereditariedade e meio (ambiente) seriam minimizadas com a adoção de vida saudável baseada nos três fatores citados. Sabedores disso, porque a abordagem de OPS (operadoras de planos de saúde) não se focam mais nesses aspectos?

Há um foco, mas normalmente restrito a informativos e campanhas. Quase nunca é uma atividade corriqueira de educar e acompanhar.  As barreiras são inúmeras. Passam pela dispersão dos beneficiários, o que dificulta o acompanhamento ou inviabiliza financeiramente, e culminam na “tragicomicidade” econômica: porque uma OPS vai se ocupar de “tratar” pessoas saudáveis se mal há verba para tratar as doentes? Nem o argumento de que o investimento (como define a ANS o gasto em prevenção), no futuro, redundará em economia, pois gestores de OPS, à vista do índice de rotatividade de beneficiários, prefere não evitar a sinistralidade da próxima…

Como estamos falando de hábitos, o acompanhamento é, necessariamente, obrigatório. Marcação cerrada, com vistas a influenciar não o comportamento de amanhã, mas o atual, que é o que se como, quanto, níveis de atividade física e a eliminação do vício do cigarro. As operadoras não estão preparadas para isso, pois sua história as dirigiu para o tratamento curativo.

Mas, pior que o despreparo das operadoras, é a falta de adesão da imensa maioria dos beneficiários. Qualquer circulação por restaurantes mostrará o quanto eles se preocupam com o que (e quanto) vai ao prato. Atividade física segue na mesma linha, enquanto o tabagismo é eliminado aos poucos (mas de forma crescente, reconheçamos).

As empresas contratantes de assistência médica não fazem questão de que a prevenção seja incluída no seu contrato, e mesmo que fizessem, não saberiam como concretizar essa ação.

A ANS, que vem se dedicando ao tema, com várias propostas importantes, está num quase impasse: percebe a importância da prevenção, mas não tem como implementar sua execução, até por falta de modelo para tal (processual e financeiro).

Enquanto isso, aqueles que se alimentam bem, fazem sua atividade física e não fumam, pagam, pelo princípio do mutualismo, por aqueles que não se cuidam e não se animam a fazê-lo.

É necessário que se estabeleçam critérios que possibilitem retornos concretos àqueles que aderem a programas preventivos. Hoje a normatização impede que sejam oferecidos descontos, por exemplo, pelo atingimento de metas. É inegável que uma pessoa que atinja um IMC normal tenha menos riscos que aqueles com obesidade mórbida. Mas há que se entender o medo da ANS: num meio em que cirurgias são negadas por questões de fluxo de caixa, o que se pode esperar em um programa de benefícios que dependa de metas?

29 maio 2012

O “diálogo” entre prestadores e operadoras de planos de saúde e a ação da ANS

Enquanto sobe o tom das discussões entre prestadores de serviços médicos-hospitalares e operadoras de planos de saúde, a ANS toma decisões pontuais, ora lamentando a falta de poder direto sobre questões de prestadores, ora lançando alguma iniciativa para apaziguar os atores.

Os prestadores de serviço médico-hospitalar (PSMH) querem melhorar sua receita. As operadoras de planos de Saúde (OPS) querem diminuir suas despesas assistenciais. O modelo com que ambos trabalham de remuneração é o fee for service, e sua adoção é histórica. Qualquer discussão que vise mudar essa forma de remuneração causa, aos olhos dos primeiros, ameaça de menores ganhos. Aos segundos, ao contrário, ameaça de maiores despesas. Daí a insistência de um e de outro na atual forma, que é ruim mas ao menos é conhecida, e ambas as partes se acham em condições de garantir seus interesses com essa fórmula.

O que não é verdade. Nem que a fórmula agrave custos ou diminua receitas, nem que as partes tenham condições de garantir interesses com ela.

Velhas discussões vêm à tona: a interferências das OPS no trabalhos dos profissionais de saúde, e o abuso, por parte dos PSMH na utilização de procedimentos e insumos, para citar as mais graves.

Vivendo entre operadoras de hospitais, não me causam mais estranhezas situações como em que uma beneficiária de uma operadora foi questionar o pedido de tomografia na cabeça por causa de uma dor no pé. Sem entender exatamente o porquê, a beneficiária foi saber da OPS se o pedido era cabível. Como também há casos em que a OPS realmente regula o que é chamado de “procedimentos de alto custo”, por motivos óbvios. Os novos tratamentos, os mais caros, são exatamente os que causam as polêmicas. E, embora exista uma grande maioria de PSMH íntegros, há os que se valem do estado de fragilidade do paciente-beneficiário, fazendo-o crer que o que está sendo prescrito é a “única salvação”, o que vira um dogma para o frágil paciente na sua discussão com a OPS.

Antes não havia essa situação? Sim, havia, mas havia também um cenário ainda pior para as OPS enfrentarem. Na medida em que se informatizaram, passaram a dar mais atenção a esse tipo de situação, o que causa essa enorme reação (negativa) por parte dos PSMH.

Enquanto uma e outra partes trabalharem sem uma visão de conjunto, com uma abordagem estanque das atividades, a discussão só tende a escalar. O que impera é o viés financeiro, sendo que pouco importa, nessa discussão entre partes que não querem se ouvir, o beneficiário-paciente. O centro da discussão é custo-receita. Enquanto isso, o beneficiário se espreme numa briga sem vencedores.

A Agência Nacional de Saúde busca, por força de lei (ou equivalente), fazer com que sumam algumas das distorções da área. A última decisão anunciada (fator de correção e periodicidade nos contratos) traz ao cenário já existente entre OPS e beneficiários, em que o reajuste é gerenciado/imposto, e a periodicidade é estipulada legalmente. Nem a existência da norma, nem sua observância estrita (alguém tem algum exemplo de OPS que não obedeça esse critério?) oferece garantia de paz entre OPS e beneficiários na questão custo do plano. Por que inferir, então, que uma simples exigência paralegal trará ao relacionamento entre OPS e PSMH?

Ademais, há e sempre haverá o descontentamento com custo-receita. Um achando que ganha pouco, o outro achando que paga muito. Solução do setor? O crescimento da verticalização, em que OPS têm rede própria de atendimento, pois a fonte das despesas é diretamente gerida pela OPS. Ou, num modelo que ainda precisa de exemplos no Brasil, a cogestão de PSMH com as OPS. Um conhecendo a realidade do outro, e ambos com vistas a oferecer o necessário e justo ao beneficiário, tratando das ações necessárias a cada caso.

Utopia? Pode ser, mas utopia maior é achar que somente leis e regulamentos farão do setor um paraíso na terra!

03 fevereiro 2012

Reprodução: Política&Poder–02/02/12

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BSB, quinta, 02.02.12

Edição Nº 1195

 

Entrevista

ANS: falta participação no combate ao aumento de custos, diz consultor

* Lenir Camimura

O consultor de saúde, Renato Okano, traçou, em entrevista ao P&P – Saúde Suplementar, o cenário da Saúde brasileira, que dividimos em quatro temas: panorama, parcerias público-privadas, planos de financiamento da terceira idade e a atuação da ANS. Na comparação entre a Saúde Suplementar e a Saúde Pública, ele acredita que os beneficiários do setor privado têm um ambiente mais favorável. O mesmo sentimento, no entanto, pode não ser compartilhado pelos empresários do Setor. Quanto à atuação da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), ele elogia a padronização e a regulamentação, mas critica ainda a falta de envolvimento da Agência junto às operadoras na construção de um sistema que seja realmente sustentável.

Panorama do Setor Brasileiro: Enquanto a saúde suplementar se vê às voltas com o aumento de custos assistenciais e é impotente contra custos administrativos, a saúde pública carece, como se viu na discussão da emenda 29, de padronizações. A ANS resolveu parte do problema ao unificar e indicar em que rubricas contabilizar as contas. O Executivo teve de tentar fazer o mesmo com a saúde pública. Mas, paradoxalmente, a garantia de atendimento que a Agência impôs ao mercado de saúde suplementar não tem contrapartida na saúde pública. Enquanto há até exigência de reembolso de deslocamento na saúde suplementar, o SUS continua de portas abertas mas sem médicos para atendimento. Como não há permeabilidade entre a saúde pública e a privada, a não ser por distribuição de renda, o panorama parece ser cada mais favorável aos beneficiários de planos de saúde que os da saúde pública. E destaque-se que a alegria dos beneficiários não encontrará eco entre os empresários do setor, pois os custos continuarão aumentando, assim como a regulação continuará crescendo.

Quanto ao financiamento da saúde pública, cabe perguntar se o problema é a existência das verbas ou da sua efetiva aplicação onde deveria. Vejo municípios com muita assertividade, fazendo história na saúde com as mesmas limitações dos outros pelo Brasil. Percebe-se que quando a verba existe e chega ao seu destino, e é bem aplicada, o resultado aparece. Pode não ser o melhor dos mundos, mas uma discussão sobre financiamento não tem cabimento sem o controle de destinação e aplicação das verbas. Quando se vê que municípios (e estados) estavam brigando para incluir gratificações salariais ou obras de infraestrutura na conta da saúde, já se pode inferir que as verbas caem todas no mesmo bolo, impedindo qualquer juízo de valor sobre qualquer ponto do que se entendo por problema.

Parcerias público-privadas: Eu nunca me canso de citar o exemplo das OSS de São Paulo, e do orgulho que um dos dirigentes tinha ao mostrar seu controle de destinação das verbas, ainda no primeiro governo Covas. Há bons exemplos de que, com uma boa gestão, o sistema é mais que possível, chega a ser exemplar. E estamos falando somente em gestão. Imaginemos, então, um cenário em que existam regras de atuação e controles para que a iniciativa privada entre no negócio (sim, é um negócio, não podemos negar). As chances de insucesso diminuiriam drasticamente, pois haveria um interessado em gerir financeiramente o empreendimento. Com as regras e controles, essa necessidade de resultado financeiro pode se casar com qualidade de atendimento, e gerar uma mudança radical na infraestrutura e estrutura da saúde do país. Como não há mágica, a execução deve ser fiscalizada de perto, mas acredito que uma boa estratégia possa colocar essa questão nos eixos. Acontece que no Brasil as grandes empresas que assumem empreendimentos têm mais voz que o cidadão, o que poderia desvirtuar alguns resultados. Finalmente, as PPP têm ótimas condições de terem importante papel na saúde no Brasil. Mas é preciso que haja critério na elaboração dos contratos, controles rigorosos de gestão e resultados e fiscalização.

Planos de financiamento da terceira-idade: Nosso sistema de saúde suplementar é baseado no princípio do mutualismo, em o risco é dividido entre toda a massa, e que viabiliza o sistema. A lei estabelece que os tratamentos de saúde não têm limitação, seja em quantidade (algumas honrosas exceções) nem em valor. A criação de um plano de previdência implicaria na criação, então, de um limite financeiro? Se não, não há o que se falar disso. Se sim, estaremos subvertendo o princípio do mutualismo e ignorando o compartilhamento do risco que essa pessoas teve até chegar à terceira idade. E se ultrapassar o valor máximo? Os beneficiários terão de tirar do bolso? Ou a operadora (ou o SUS) arcam? O maior problema da discussão é que ela vai de encontro a conceitos fortes no mercado, e práticas que terão de ser mudadas. Estou acompanhando as discussões, mas elas parecem contaminadas pela emoção. O que se gasta hoje, ao menos idealmente, na terceira idade, é na medicação, que não é coberta pelos planos. Talvez não fosse o caso de um VGBL, mas de uma política de acesso a medicamentos a terapias. De qualquer forma, a poupança para garantir a pessoa na velhice, enquanto há o plano de saúde, deveria ser de responsabilidade dele. Quanto ao custo, sempre crescente, ele tem de ser enfrentando na mesma base que os demais problemas de envelhecimento da população causa: de uma forma holística, não compartimentado por setores. Por exemplo, o problema atingirá aposentadorias e pensões. Vamos ter de fazer poupança para garantir a complementação da poupança? (ou já somos obrigados)? De qualquer forma, o problema é estrutural e não exclusividade da saúde.

A melhor possibilidade de enfrentar esse problema é, como de hábito em qualquer setor, a prevenção. Citando a questão do remédio, é mais barato à operadoras pagar um remédio de hipertensão, por exemplo, do que bancar as custas de um agravamento de saúde por falta de cuidado do paciente. A prevenção é a melhor saída, Além dos custo financeiro, há os sacrifícios pessoais que decorrem de um problema de saúde como um AVC com sequelas. A qualidade de vida da pessoa e de sua família pode sofrer uma queda brutal de qualidade em função de em eventos desses. Operadoras ainda não estão se dedicando ao assunto como poderiam (e deveriam). Uma acha que, por causa da rotatividade entre beneficiários (está a portabilidade para comprovar) vai levar seu investimento para a concorrência. Miopia administrativa. Mas com fundo de verdade. Há aquelas que ainda consideram que “saúde” é igual a “tratar os doentes”. E a posição da ANS tem sido sinalizadora de que esse é o caminho, mas falta veemência. Ela impede, por exemplo, que haja bonificações em programas de prevenção vinculados a metas. Mas e se eu quiser estabelecer uma parceria com meu plano de saúde dessa forma? Uma pessoa com IMC de obesidade mórbida tem sabidamente mais riscos que uma de IMC normal. Por que impedir, então, que haja um controle bonificado de evolução, já que é um indicador fortíssimo de redução de riscos? Prevenção, ela é quem vai determinar o rumo da saúde, mais que qualquer poupança para cuidar da saúde.

Atuação da ANS: A ANS, não me canso de dizer, é a agência mais atuante do país. No último ano, impôs medidas que certamente ajudarão o beneficiário de planos de saúde na sua inglória luta pela saúde. Mas tenho um viés crítico com relação a algumas medidas. Por exemplo, ao exigir a publicação da rede credenciada na internet, ela resolve qual problema? Pois se um médico pede um procedimento específico, o beneficiário tem de recorrer à operadora para saber onde vai executá-lo. Não é questão de desconhecer a rede, mas de desconhecer quem na rede executa o procedimento. E isso não está na medida. Também a consulta a coberturas. Quantas pessoas sabem o nome do procedimento garatujado pelo médico? Poucas. São algumas medidas inócuas que, perto da questão dos anestesistas e das próteses, somente para citar duas “bombas A”, não se justificam. Por que a ANS não se debruça, junto às operadoras, repito para frisar, JUNTO às operadoras para atacar os grandes ofensores de custos assistenciais? A presença da ANS garante o interesse do consumidor/beneficiário, e a operadora de plano de saúde garante a informação fidedigna. A ANS tem uma ótima chance, mas às vezes se perde em detalhes que não acrescentam nada ao setor. O mercado, do qual saíram alguns, profissionais da ANS, garante a ela o reconhecimento de que alguns problemas estão sendo enfrentados. Mas peca, por falta de visão crítica verbalizada, quando há omissão da agência.

Em tempo:

§ Gestores de diferentes empresas se esforçam para equilibrar gastos e aumentar os lucros, na tentativa de manter um balanço financeiro saudável. Apesar disso, precisam lidar com o fato de que uma grande fatia deste bolo é abocanhada por fraudes que ocorrem interna e externamente. De acordo com estimativas da Associação Brasileira das Empresas de Medicina de Grupo, aproximadamente 20% das despesas de atendimento em operadoras de planos de saúde são representadas por fraudes. Segundo Arlindo de Almeida, presidente da Abramge, as principais fraudes se encaixam em duas modalidades. Existem aquelas cometidas na rede credenciada como pedidos de exames excessivos e desnecessários, retornos cobrados como novas consultas, serviços com códigos diferentes do procedimento efetuado, internação por tempo excessivo e internação em UTI desnecessária. Nessa categoria, Almeida encaixa ainda o caso de materiais de alto custo superfaturados e medicamentos genéricos cobrados como medicamentos de marca. Há também, segundo o gestor, a modalidade das fraudes cometidas pelos pacientes, como quando há falsidade nas informações na entrevista médica qualificada ao contratar o plano, ou mesmo quando o paciente fornece sua credencial para outra pessoa que não pertence ao convênio. Em relação a este último tipo de fraude, estimativas da Abramge apontam para uma redução de 3,5% no custo dos planos de saúde ao serem adotadas medidas para inibir essa prática, como os sistemas de identificação biométrica. Além de ferramentas como esta, Almeida sugere outras estratégias para prevenir fraudes corporativas. Ele realça a importância de auditorias com visitas aos pacientes internados e auditorias nas contas para internados e não internados. É preciso, também, convencer os consumidores a adotar uma postura ética: “Com a divulgação sobre o fato de que a fraude se constitui um crime e pode ser causa de rescisão de contrato, além de processo criminal para o autor”, explica. (Saúde Web)

§ Ao menos 450 mulheres que possuem silicone da marca francesa PIP querem propor um acordo à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para evitar entrar com uma ação judicial em decorrência dos problemas com as próteses – feitas com silicone industrial, não homologado nem aprovado para uso médico. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo. Essas mulheres integram a Associação de Vítimas PIP – grupo que foi criado no dia 12 de janeiro e já recebeu cerca de 3 mil contatos de vítimas interessadas em se unir à associação. A intenção dessas mulheres é entrar em acordo para que a Anvisa forneça gratuitamente novas próteses para que todas possam trocá-las por conta própria, mesmo aquelas que o silicone não rompeu. O SUS e os planos de saúde só vão arcar com a troca das próteses em mulheres que o silicone se rompeu e poderá causar problema de saúde. A associação é representada pela advogada Daniela Wobeto, especialista em direito internacional. Para tentar o acordo com a Anvisa, Daniela reuniu-se ontem à tarde com representantes do Ministério Público Estadual e do Ministério Público Federal, em Porto Alegre (RS). Cerca de 80% das mulheres cadastradas na associação são do Sul do País.

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12 janeiro 2012

Excesso de zelo–Complicando o que já é complicado (Sobre a Folha de São Paulo e o site DirectSaúde)

O artigo está aqui. É da edição de hoje (12/01/12) da Folha de São Paulo. O site DirectSaúde venda consultas e está sendo considerado irregular pelas associações respectivas.

Vamos à polêmica.

Pelo relato do jornal, funciona assim: a pessoa se cadastra, não paga nada mensalmente. Quando quer, pesquisa no site os médicos cadastrados, e a consulta sai por R$ 54,00 (cinquenta e quatro reais), quando a consulta com esses médicos pagos diretamente sai por até R$ 300,00 (trezentos reais). O pagamento é feito por intermédio de um cupom. O site ganha um percentual de 10% (dez porcento) das consultas.

Perto de 25% da população brasileira tem algum tipo de plano de saúde. Alguns são ambulatoriais, que cobrem somente consultas, exames e procedimentos. Os demais (três quartos da população brasileira) não têm acesso a consultas exceto se pagarem por elas diretamente, na chamada tabela Particular. Ou se submetem às filas do SUS. O site, de certa forma, está facilitando o acesso ao serviço médico. O paciente recorre a médicos que se dispuseram a aceitar as regras de valores e comissões. Mas isso não comove o CREMESP, que critica o site e os médicos por causa da famosa ética médica. Compara os serviços a cartões de desconto, modalidade que a ANS defenestrou ao proibir operadoras de planos de saúde de comercializarem esse tipo de serviço. Outras empresas, que não são operadoras, vendem e com sucesso esses cartões de desconto, que não é o caso da DirectSaúde. Nos cartões de desconto, há desembolso, seja mensal, seja anual, para fazer jus aos médicos conveniados. Portanto, usando ou não, as empresas de cartões de descontos auferem seus lucros.

A parte da população que com esse tipo de serviço (DirectSaúde) tem acesso aos serviços médicos (para consulta direta) é enorme. Mas é alvo de críticas. Pergunto: isso interessa a quem? A ninguém fora do cartório médico.

É preciso relativizar o serviço. A pessoa que precisa de um médico provavelmente precisará de exames complementares. Isso o site não cobre, e o paciente precisará pagar por eles. Então, a prestação de assistência médica é limitadíssima. Mas já é um lenitivo em um país em que até quem tem plano de saúde já encontra dificuldades para fazer suas consultas, o que dizer das pessoas que não tem um?

A Folha de São Paulo, anteriormente, atacou um site de compras coletivas em que eram vendidas consultas por telefone. Nesse caso, havia algum fundamente, embora essa modalidade de consulta (remota) esteja cada vez mais se impondo como alternativa viável e confiável às visitações obrigatórias ao médico. Mas, neste caso, parece haver exagero no enfoque. A população tem mais acesso aos médicos, os valores estão dentro (ou acima) do que pagam os planos de saúde, que mal há nisso?

Deve ser a tal da febre investigatória…

Em tempo: não conhecia o site, nem o serviço. Não conheço nenhum dos proprietários, mas achei boa a ideia. Mas quem deve ter adorado a matéria deve ter sido o proprietário do empreendimento. Ganhou uma enorme propaganda…

11 janeiro 2012

Sistemas de gestão em operadoras e hospitais

Hospitais e planos de saúde são atividades empresariais, por menos que se queira admitir. São empreendimentos que precisam, no mínimo, empatar custos e receitas. Claro que se empatar a empresa está com problema. Por isso, todo cuidado é recomendável para fazer frente às especificidades do mercado de saúde e para garantir competitividade. A mais básica das ações é a automação do negócio.

Há diversos fornecedores de sistemas de gestão (também chamados de ERP) no mercado, nacional e internacional. Como o Brasil é um país de forte regulação, os produtos a serem vendidos aqui precisam de ajustes consideráveis. Além disso, há excelentes produtos nacionais que, em termos de funcionalidades, são muito mais aderentes que os estrangeiros. Já na entrega (implantação), não deixam nada a desejar aos maiores fornecedores mundiais: há problemas, e sérios.

O caráter indispensável do sistema de gestão

Controles são, em qualquer área, importantíssimos para que o empreendimento se mantenha dentro de padrões previsíveis e aceitáveis. O que dizer de controlar manualmente as interações medicamentosas de um processo de prescrição hospitalar sem um sistema para fazer a checagem das milhares de possibilidades. Ou avaliar se a mulher ainda tem o útero para aprovar um parto, por exemplo, numa operadora de plano de saúde. O controle dessas informações passou a ser exigência do produto de gestão, e sua realização deve ser silenciosa, o que quer dizer que o usuário muitas vezes nem toma conhecimento do processo. Ademais, vários dos produtos já têm alguma forma de workflow, o que dinamiza a gestão e uniformiza os procedimentos.

Com a quantidade de informações necessárias à gestão, é impensável que um empreendimento não contemple um sistema de gestão.

Desenvolvimento interno ou aquisição de produto?

Interessante como esta discussão ainda existe. Se fosse qualquer outra área da empresa, o consenso seria o de terceirização. Mas a área de sistemas ainda vive o dilema.

Se não for uma megaempresa, a opção óbvia é a terceirização. Os custos de desenvolvimento interno são altíssimos, e a experiência do grupo desenvolvedor é por demais limitada para que o processo seja célere e eficiente como se deseja. Sem contar que, internamente, outras necessidades se impõem ao desenvolvimento, o que, embora não seja óbvio, impacta negativamente escopo, prazos e custos da construção local de software e suas funcionalidades.

Além do mais, há a questão do foco. Há tantas informações exigidas pela legislação e pelas boas práticas administrativas que a equipe interna já se sobrecarrega somente com geração de demonstrativos e relatórios. As melhores utilizam essas informações para identificarem tendências e desvios, atuando sobre elas no primeiro momento possível, próximo à sua identificação. No caso de equipes de desenvolvimento internas, todo o foco é para a construção de novas funcionalidades ou apagar incêndios. Não há foco que resista a demandas e problemas internos.

Os custos de desenvolvimento também contraindicam o desenvolvimento interno. Enquanto os fornecedores compartilham seus custos com vários clientes, a empresa que desenvolve internamente arca totalmente com seus próprios custos. Paradoxalmente, muitas dessas empresas terceirizam o desenvolvimento interno, com a condição de que o fornecedor possa comercializar o software resultante, o que demonstra que o custo compartilhado é a melhor opção (fornecedor externo, portanto). Para encerrar o assunto: quanto custam as adaptações decorrentes de normas provindas da ANS, por exemplo?

A seleção do produto

O produto de gestão deve ser aderente aos processos da empresa, certo?

Não, não necessariamente. A menos que os processos da empresa tenham a capacidade de produzir vantagem competitiva confirmada, é sempre interessante analisar sem paixão o processo embutido na lógica de construção do software. Os fornecedores normalmente atendem aos requisitos de processos de seus clientes, e ajustam as diferenças em parâmetros de sistema. O quer dizer que há ali um benchmarking embutido. Assim, o produto em análise deve ser considerado pelo resultado final de cada processo (funcionalidade), não necessariamente pelo processo em si. Insisto em que se o processo interno não trouxer vantagens óbvias competitivas, ele deve ser analisado. Caso contrário, é somente uma (má) concessão da empresa ao medo de mudança de seus funcionários.

O preço é importante, mas não a ponto de dispensar algumas funcionalidades.

Muitas empresas iniciam seleção do produto sem avaliar seus processos internos. Nesse passo, exige do fornecedor funcionalidades que automatizam o erro ou, quando muito, são uma volta mais longa para chegar ao destino óbvio. Compreensível que seja assim. A mudança de sistema é traumática, e a carga sobre o pessoal operacional é forte. Esse é um jeito de oferecer concessões à equipe, como forma de compensação (ao menos percebida). Mas há um custo, e ele é bancado pela empresa. Melhor seria se os processos fossem avaliados e melhorados antes da aquisição de novo software.

O resultado final dessa atividade é a otimização dos processos de trabalho, melhorando a performance e tirando do software necessidades de customização que não existem.

A implantação do produto

Enquanto o mercado de prestação de serviços vai na direção do “esforço mínimo”, a área de software continua na mesma situação de quinze anos atrás. Explicando: os serviços e produtos são entregues já em ponto de consumo pelo fornecedor, sendo mínimas as atividades deixadas para o cliente. Os fornecedores de software, ao contrário, um dia acharam que o cliente deveria ele mesmo parametrizar seus produtos, e optou por ensinar a parametrizar. Resultado: inúmeros (a grande maioria) casos de implantações que se arrastam(ram) por anos a fio, não sendo raros os casos de desistência. Na nova abordagem, os parâmetros são introduzidos por consultores de negócios que  previamente se informaram sobre a forma de trabalho do cliente, para garantir que a “virada” do sistema se dê no menor prazo possível. Isso feito, todo o treinamento é realizado, inclusive sobre a parte realizada pelos consultores de implantação.

Há fornecedores que veem nessa abordagem perda de receita, uma vez que a implantação que demora doze meses pode ser feita em quatro. Esquecem-se de avaliar o aspecto global de seu produto, que é a soma das funcionalidades existentes a facilidades de uso e aqui se inclui a implantação.

Complementarmente, a consultoria oferecida pelo fornecedor é, salvo honrosas exceções, de software, e não de negócio. Por esse motivo, deixam de ser exploradas funcionalidades excelentes e alternativas à forma de trabalho do cliente. Como resultado, há uma “meia” automação das atividades da empresa compradora.

 

Concluindo, o software de gestão deve ser compatível com as necessidades da empresa, considerado o mercado como um todo. A análise de aderência é fundamental para a seleção correta do fornecedor/produto, e principalmente para reavaliação dos processos internos. E a implantação deve contar com um comitê firme, com representante(s) do fornecedor, de forma a adotar as melhores práticas e propiciar gestão adequada do projeto, que pode ficar muito mais caro se não observadas estas condições.

06 janeiro 2012

Os prazos de atendimento na Saúde Suplementar

Festejou-se muito pelo país o início da vigência da norma sobre prazos máximos de atendimento da saúde suplementar. Acho que não é bem o caso.

A RN 259, depois complementada pela RN 268, prevê prazos máximos de atendimento EM DIAS ÚTEIS. Então, quando se fala em 7 dias, é bom lembrar disso. E, lembrando disso, não parece que 21 dias (úteis) seja um prazo razoável para alguns procedimentos. Ademais, a norma foi precedida por uma consulta às operadoras, visando conhecer seus prazos de fato. Pois bem, essa informação não foi compartilhada com a população, deixando dúvidas sobre o real ganho da medida.

Friamente, uma regra que estabelece prazos é melhor que nenhuma regra sobre o assunto. Na prática, não se sabe se há condições de mudança de alguma coisa. Inicialmente porque não há, na norma, um rito de acompanhamento. As reclamações embasar-se-ão nas alegações dos consumidores, restando à operadora provar o contrário (como bem prevê o Código de Defesa do Consumidor). Poderia ser mais simples. NO caso de necessidade de uma consulta na especialidade, abre-se um processo automatizado, e com registro para acompanhamento da ANS, até sua satisfação. A medida traria agilidade para o atendimento do pleito e geraria informação importantíssima para ação da ANS, presumindo-se que ela exista.

Depois, há casos de operadoras em que o limite estabelecido é igual ou acima ao observado. Pode-se esperar, para clientes dessas operadoras, uma acomodação (para pior).

Ainda há o caso dos serviços não prestados nas regiões de saúde. Inexplicavelmente, quando um produto referência é aprovado, a ANS leva em consideração sabe-se lá o que para avaliar o dimensionamento da rede prestadora a ele destinado. Isso porque uma consulta pública que pretendia regular a matéria nunca virou norma (Consulta Pública 26). Mesmo que virasse, convenhamos, supriria itens básicos, mas não garantiria a cobertura credenciada para todos os procedimentos do Rol. A solução, então, é dizer à operadora que ela tem de prover o serviços, às suas expensas diretas ou via ressarcimento (reembolso não regulado). Mas o beneficiário, quando contrata seu plano de saúde, imagina que todos os procedimentos estão garantidos, ficando longe de imaginar que precisará de algumas batalhas (e possível desembolso) para fazer valer sua cobertura contratada. A pergunta é: porque no registro do plano/produto a ANS já não avalia que procedimentos estão descobertos?

Os prazos de atendimento serão acompanhados? De que forma? E em que periodicidade? Como devem reclamar os beneficiários? E a quem? Em que se basear?

Acho que ainda não há o que comemorar.