Desde sempre, o modelo de pagamentos envolvendo operadoras de planos de saúde e prestadores de serviços é baseado na execução do serviço, o fee for service. Realizado o procedimento, para o qual foi devidamente contratado (e contratualizado), e baseando-se em tabela(s) negociada(s), de acordo com características do atendimento acordadas, o prestador recebe o valor pactuado.
Numa modalidade diferente e rara, o capitation é a modalidade em que o prestador é o ponto de atendimento de determinados tipos de procedimentos, e recebe um valor fixo para isso, baseado no total da massa à qual se estende a cobertura. Mas é sempre baseado na execução pura e simples do procedimento.
As atuais abordagens de prevenção a doenças, gerenciamento de crônicos e gestão clínica de casos, entretanto, precisam fugir desse modelo.
No caso da prevenção o objetivo final é fazer com que a sinistralidade diminua. Consequências naturais desse processo são (ou deveriam ser) o incremento da qualidade de vida do indivíduo, a protelação do surgimento das doenças e a manifestação menos agressiva das mesmas. Mas para que a prevenção seja realizada são adicionados diversos procedimentos, o que aparentemente contraria a tese de diminuição da sinistralidade. Casos do mercado mostram que não é bem assim. As despesas podem até aumentar em determinados casos, no início da abordagem. Mas, ao longo do tempo, a tendência é que sejam menores que os tratamentos dados aos casos mais graves das doenças. Mais: sabendo do impacto financeiro inicial, algumas operadoras estão negociando formas diferentes de pagamento à rede credenciada, ou mesmo dirigindo essas ações preventivas às redes próprias.
Nos casos de gestão de crônicos e gerenciamento clínico de casos, o modelo já se aperfeiçoa um pouco. Como são casos em que o custo já é acima da média, a negociação visa reduzir esses custos para patamares mínimos possíveis. Ganhos enormes já se apresentam, além do aumento da satisfação dos beneficiários envolvidos.
Mas ainda há um caminho a trilhar. As negociações ainda se baseiam no fee for service. Ainda não existe abordagem para que o beneficiário seja cuidado e que os resultados desse cuidado é que sejam remunerados. A rede de prestadores, com seus diversos tipos, ainda é dispersa e desconectada, com cada qual realizando suas atividades sob a demanda da procura do beneficiário, e cobrando a operadora por isso.
Em decisão recente, uma cooperativa foi condenada pela detecção tardia de um câncer em uma paciente. Somente depois de dezessete consulta é que se deu o diagnóstico, vindo a paciente a falecer em decorrência da doença. Dezessete consultas não foram suficientes para detectar o problema? Mas foram, imagino eu, devidamente cobradas (e pagas) da operadora. A abordagem do fee for service é, no mínimo, reducionista. Trata a saúde como fenômeno isolado, restrito a procedimentos também isolados. Tanto que muita gente já se impressionou com a rapidez com que são realizadas as consultas chamadas de retorno, em que o médico analisa (geralmente) laudos de exames solicitados, medica e libera a pessoa. A sensação que se tem é que o procedimento, não pago pelas operadoras, toma o lugar no faturamento do profissional.
Da mesma forma, depois de atendidos em hospitais, pacientes são liberados com poucas ações ativas de acompanhamento do caso. Dependem, no mais das vezes, de ação do paciente, que busca seu acompanhamento junto aos médicos de confiança. As operadoras e os prestadores não têm protocolos de atenção para acompanhamento do caso e, quando têm, não estão estruturados para efetivá-los.
A cadeia de fornecedores também tem suas limitações. A totalidade dos produtos de gestão, seja de operadoras, seja de prestadores, não incluem a possibilidade da gestão dos resultados globais do paciente, nem das formas de cobrança que poderiam ser inerentes a esse tipo de ação. E, claro, nem poderiam os fornecedores oferecer esse tipo de resposta, pois ainda não há demanda, o que torna qualquer funcionalidade inócua.
As recentes ações da ANS, aliadas à percepção geral de que a solução de parte dos problemas do mercado de saúde suplementar no Brasil passa pela mudança de alguns paradigmas, prevenção incluída, pode direcionar essa questão. Já há discussões sobre o pagamento por resultados, assim como já há tentativas de adotar outras formas de atenção à saúde (não baseados em simples atendimento à demanda).
O mercado vai mudar.
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