28 dezembro 2012

A Saúde Suplementar em 2013

 

A chegada da United Health ao Brasil mostra que o mercado ainda é atraente, apesar das reclamações das atuais operadoras. A líder do mercado americano não se aventuraria se não tivesse projeções favoráveis no rigoroso mercado brasileiro. Mas ela adquiriu uma empresa estruturada, verticalizada e profissionalizada em termos de gestão e gestores. Desse jeito, a conta deve fechar.

Os prestadores de serviços médico-hospitalares são uma parte importante desse tal processo de cuidar das pessoas. Isolado, entretanto, ele não é eficaz. A Amil entendeu isso, bem como entendeu a importância de conjugar os custos da prestação de atendimentos ambulatoriais e hospitalares com as necessidades do paciente (que é o beneficiário adoecido). E na sua receita de crescimento incluiu a compra de carteiras de operadoras, mas expandiu a rede adquirindo também hospitais. De forma geral, contém os custos dirigindo os atendimentos à sua rede, sempre que possível. Os números permitem concluir que a receita tem resultados bons.

Autogestões e verticalização

As autogestões não têm tradição de manter rede própria, exceto ambulatorial, exceção restrita às grandes. A maioria nem tem condições de operar assim, e seria realmente temerário se cada uma resolvesse se embrenhar por esse caminho. Além de ser um negócio (sim, é um negócio, queiram ou não) com conhecimentos específicos, o risco é alto demais para um “setor de RH gerenciar.

Dessa forma, a “solução AMIL” não cabe às autogestões.

Seguradoras e verticalização

Por uma questão legal, Seguradoras não podem ter rede própria. Inicialmente trabalhando com rede referenciada, depois passando ao credenciamento, essas empresas tiveram de passar por uma fase pesada de adaptações de negócio depois que a ANS foi criada e substituiu a SUSEP na condução da saúde suplementar.

Dessa forma, às seguradoras não cabe a “solução AMIL”.

Filantropias e Medicinas de Grupo

As medicinas de grupo, modalidade em que se enquadra a AMIL, é a que tem maiores condições de equilibrar seus custos com uma rede abrangente.

Não o fará, entretanto.

Historicamente, as medicinas de grupo se formaram em função do atendimento de um hospital (ou um grupo), que resolveram ampliar sua atuação fidelizando seus clientes num plano de saúde. Campeãs de vidas antes da Lei, tiveram muita dificuldade para se adaptar, tanto que várias fecharam imediatamente, e outras vêm sendo liquidadas ao longo do tempo pela ANS. As mais estruturadas acabaram sendo alvo da AMIL, que se baseou nesse tipo de aquisição para seu crescimento vigoroso. No caso mais emblemático, está a compra da Medial Saúde, que tinha uma rede própria bem vistosa.

Ademais, quando se fala de aumentar a rede, a medicina de grupo se depara com um dilema: aliar-se a outros hospitais (dos quais parte tem relação societária com operadoras) é oferecer a garganta á guilhotina, e nesse mercado o medo do canibalismo é o monstro debaixo da cama. Cada medicina de grupo enxerga a próxima como concorrente, o que impede maiores negociações entre elas.

Ah, sim, as filantropias. Normalmente são entidades seríssimas, com belos projetos de saúde e bem estar, mas afogadas em dificuldades financeiras e mesmo dívidas. Estão mais preocupadas em sobreviver, e enquanto não saírem desse estado, não se ocuparão em resolver outros (graves) problemas, já ensinava Abraham Maslow.

Dessa forma, a “solução AMIL”, embora possível, parece improvável.

Cooperativas médicas

Dentre as cooperativas médicas, há as Unimed, sendo que muitas têm serviços próprios (hospitais, ambulatórios, pronto-atendimento, SADT). Seu grande diferencial é que, pelo intercâmbio, os beneficiários de uma Unimed podem utilizar os serviços de outras (rede própria ou credenciada), o que poderia transformá-las em candidatas naturais à “solução AMIL”.

Na prática, cada Unimed é uma. Singular, que é como se chamam mutuamente (aquelas que não associações de Unimed). Sendo mais de trezentas e cinquenta cooperativas, o grande público as enxerga com uma entidade única, o que não corresponde bem ao seu dia-a-dia. Cada qual tem seu viés administrativo, cada qual tem sua visão de custos (e preços, portanto). Além do mais, as regras de pagamento e cobrança de intercâmbio acabam eliminando o que poderia ser vantagem competitiva, pois o hospital é também um negócio, inclusive atendendo a outras operadoras de planos de saúde.

A “solução AMIL”, portanto, para ser almejada pelas cooperativas, precisaria de uma mudança de paradigma entre as Unimed que parece ser de execução bem difícil.

2013

O ano de 2013, portanto, continuará sendo parte da transição empresarial de que tanto se fala. Já se noticiou a negociação entre a Golden Cross e um grupo estrangeiro, o que deve ser a tônica para as grandes operadoras em 2013. Mas isso para as grandes.

As autogestões continuarão nos seus esforços para transformar a prevenção em resultados palpáveis, e a falta de demonstrações mais sustentáveis de retorno de investimento será o grande adversário. A pulverização das vidas dessa modalidade também deve ser problema a ser combatido, e vejo que somente uma atuação conjunta das associadas da Unidas (associação de classe da modalidade) pode solucionar essa barreira.

As seguradoras continuarão a ser os grandes alvos de reclamações de prestadores de serviço, e sua direção somente será dada após uma grade tendência surdir no mercado. Por sua atuação fortemente empresarial, têm todas as condições de enfrentar a questão da prevenção de doenças e riscos e promoção da saúde. Mas sua origem empresarial limitará as ações ao público que realmente demonstre ter custos suscetíveis a diminuição (doentes crônicos graves, casos de custos altíssimos, etc.).

As medicinas de grupo, excetuada a AMIL e uma dezena de honrosas exceções regionais, continuarão na sua luta pelo azul contábil, até que despertem interesse em grupos empresariais maiores ou até que ousem firmar parcerias com aqueles que hoje enxergam como concorrentes. A força desta modalidade estará na união, como demonstram as cooperativas. Mas paixões terão de ser debeladas antes que isso aconteça. O ano de 2013 deverá ser de calor para esta modalidade (mais as filantropias), calor para equilibrar suas contas.

As cooperativas têm demonstrado ações no sentido das melhores práticas de mercado. Várias buscaram profissionalizar suas equipes de gestão, e algumas têm experimentado uma sólida evolução. Mas o ano 2013 deve manter mais do mesmo, com a tendência de mais problemas em cooperativas com dificuldades financeiras.

A ANS deve manter suas ações regulamentadoras e regulatórias, como demonstra a Consulta Pública sobre este assunto. Ainda sem um presidente indicado pela presidente da república, não se sabe, entretanto, que rumos poderá tomar, a depender de quem assumir a agência. O fato é que a publicação de mapas na internet e a agenda em conjunto com o ministério da saúde não trazem resultados práticos eloquentes. O fato de impedir operadoras de planos de saúde de comercializarem seus planos não resolvem os problemas dos beneficiários com dificuldades, embora tragam dificuldades para as próprias operadoras. O mercado criticou muito a agência por seus dirigentes egressos do mercado, supondo que estes defenderiam interesses escusos, o que não ocorreu. Também não ocorreu o inverso. O ano de 2013 seria excelente, entretanto, se a ANS conseguisses aglutinar interesses em torno de si para viabilizar o avanço de suas medidas para a rede prestadora de serviços; se atuasse imediatamente na questão dos custos abusivos de órteses e próteses; se regulasse mais decisivamente em função de indicadores e menos em função de estruturas (ouvidorias ou processo de atendimento ao cliente?); se tornasse mais célere a adoção de medidas protetoras de beneficiários com dificuldades; se agisse no sentido de manter operadoras (e seus beneficiários), em vez de liquidações e portabilidades especiais. É, talvez um ano seja pouco…

Para encerrar, um clichê: 2013 será um ano decisivo (como foram todos até agora).

10 dezembro 2012

Autogestões–Operadoras diferenciadas

Dentre as modalidades de operadoras de planos de saúde, uma se destaca pelo caráter não comercial: a autogestão.

A operadora na modalidade Autogestão diferere, em síntese, das demais modalidades:

  • pela limitação na prestação de serviços: funcionário (ativos ou aposentados), grupos familiares, etc., da empresa (ou das empresas) responsável pela operação;
  • a ausência de lucro nos objetivos empresariais da empresa (embora não se furte a buscar resultados financeiros positivos na atuação).

(Empresas públicas que administrem diretamente seus planos de saúde não estão sujeitos à legislação da saúde suplementar.)

As autogestões têm atuação diferenciada no mercado de saúde suplementar. É mais correto dizer que os planos de saúde são um benefício oferecedo pelas patrocinadoras das autogestões, o que as coloca em posição de enxergar a operação de forma diferenciada.

Focando o bem estar do funcionário e sua família, a autogestão faz contas diferentes em relação ao mercado. Não é o valor do atendimento, mas o impacto geral no ânimo do trabalhador. Para exemplificar, conheço autogestões que não se restringem ao atendimento médico-hospitalar na sua atuação: subsidiam (ou mesmo pagam integralmente) itens como gás de cozinha, óculos, medicamentos diversos (desde que prescritos, e não somente para doenças crônicas) interal ou parcialmente, etc.

Assim, o que seria lucro reverte-se para mais benefícios.

Mesmo na atividade que parece ser o maior desafio das operadoras de planos de saúde, o da promoção da saúde e prevenção de riscos e doenças as autogestões estão um passo à frente (ou poderiam estar).

Na maioria as OPS, a dispersão dos beneficiários é tal que a aplicação de ações e atividades de prevenção e promoção tem custos que as tornam proibitivas, embora ações venham sendo empreendidas por medicinas de grupo que têm rede com uma certa abrangência. Mas os resultados práticos têm feito refluir as iniciativas dessa espécie, sempre do ponto de vista financeiro.

Autogestões têm um ponto comum aos beneficiários, que é o local de trabalho. Torna-se mais fácil empreender ações para seus beneficiários, sejam eles ativos, aposentados ou mesmo dependentes. O afluxo é mais natural, até por causa da relação que os beneficiários têm com a empresa. E, de fato, há muitas ações de relativo sucesso no Brasil envolvendo autogestões.

Apesar de suas vantagens, as autogestões têm vários problemas comuns às demais operadoras. A sinistralidade (ou custos crescentes, já que sinistralidade é um conceito nem sempre aplicável às autogestões) é um deles. Ações de regulação que são adotadas pelas operadoras comerciais também o são pelas autogestões, embora com rigor menor quando envolve diretamente atendimento ao beneficiário. Negociações com a rede prestadora, dificuldade de manutenção da rede (em função de volume de atendimentos, dispersão, práticas monopolistas de algumas áreas) são as maiores ameaças à modalidade de autogestão.

Além disso, há autogestões que enfrentam graves problemas financeiros (causados por uma confluência de fatores, mas que não podem ser ignorados), o que leva a modalidade a questionamentos por parte das próprias patrocinadoras. Um dos maiores problemas é a expertise dos profissionais das autogestões em enfrentar problemas conhecidos de mercado, já que eles são, normalmente, pessoas do departamento de recursos humanos designados para atuar em área de conhecimento diverso daquele necessário à sua atribuição inicial. Com honrosas exceções (principalmente nas grandes autogestões), de fato é uma grande dificuldade que levou ao encerramento de diversas autogestões (algumas pioneiras nesse segmento, que de operadoras passaram a ser contratantes de planos de saúde).

Adicionalmente, há entidades públicas de autogestão (sem registro na ANS, dispensadas que são) que enfrentam gravíssimas dificuldades financeiras, arrastando com elas diversos prestadores de serviços médicos hospitalares pela falta de pagamento. Tal realidade depõe contra as autogestões de fato, ciosas de seu dever de bem administrar e oferece serviços da melhor qualidade.

Tudo sopesado, minha avaliação é que a autogestão é a melhor modalidade de operação de planos de saúde. É a mais flexível, a de maior facilidade de integração com o beneficiário, e a de maior possibilidade de sucesso no desafio de reduzir custos e enfrentar o crescimento das doenças crônicas e do envelhecimento da massa. Mas é preciso que haja uma ação coordenada, planejada, orquestrada com objetivos bem definidos para garantir sua presença nesse mercado bem inóspito.

Nesse caminho, vejo dois atores que podem consolidar decisivamente a força da autogestão: A CASSI (dos funcionários do Banco do Brasil) e a Unidas (entidade de classe das autogestões). A primeira com uma rede das mais abrangentes e diversificadas. E a segunda como força orquestradora, ambas atuando em conjunto para oferecer base para que empresas de cinco, dez ou cem mil funcionários se organizem em autogestão e tenham um mínimo de rede prestadores, tecnologia e base de conhecimento para atuação. Se as cooperativas podem, por que não as autogestões?